Abracadabra 2
Eu não sou particularmente um fã do primeiro Abracadabra, filme de 1993 sobre três bruxas que têm sua propriedade invadida por crianças que fazem intolerância religiosa. Acho o filme meio bobo demais, envelheceu mal e fico particularmente irritado com um momento em que as bruxas, que possuem vassouras voadoras, são detidas e não sabem como proceder em frente a um portão alto. Pelo menos é o que diz a minha crítica do Letterboxd, eu não lembro direito do filme, pra ser sincero.
A sorte é que ninguém precisa assisti-lo de novo para ver Abracadabra 2, que chegou no Disney+ em 30 de setembro: logo no começo do filme um personagem faz um resumo dele de forma orgânica, integrado à história.
As bruxas de Salém
Na verdade, o filme começa no século XVII, com a infância das três bruxas interpretadas por três crianças muito bem caracterizadas como as irmãs Sanderson, as bruxas protagonistas dos dois filmes. O prólogo da história é tão bem feito que a minha vontade era de ficar nele no filme todo: na história real das bruxas de Salém.
Em 1692, na pequena cidade do Massachussets, mais de 200 pessoas foram julgadas, acusadas de bruxaria. Nenhuma delas foi queimada, mas 19 foram enforcadas (14 mulheres e 5 homens), um outro homem foi esmagado até a morte, e pelo menos cinco pessoas morreram na prisão. Esse negócio de acusar os outros de bruxaria, prática que já tinha se mostrado um sucesso em retirar da sociedade gente considerada indesejada na Europa (apesar de que pelo que eu lembro, por lá uma bruxa tinha que pesar o mesmo que um pato), parecia estar chegando com tudo nas Américas. É claro que os julgamentos foram nefastos e a inocência dos julgados só foi devolvida em 2001, um pouco tarde considerando que eles já tinham morrido há mais de 300 anos.
Mas a fama pegou e Salém ainda se aproveita dela. A cidade abusa da temática de bruxa e lota todo Halloween, em geral com visitantes de Boston que querem curtir uma das maiores festas de dia das bruxas fora de Hogwarts. A cidade é cheia de comércios esotéricos, lojas com cheiro de incenso vendendo bugiganga chinesa temática e pubs irlandeses. Até os carros de polícia são adornados com um logo que remete às bruxas.
A Salém de hoje em Abracadabra 2
Mas o filme é bem justo na atual caracterização da cidade. Realmente ela é hoje uma cidade universitária e lojinhas de bobagens se amontoam às dezenas nas adoráveis ruas de lá. As novas personagens que conduzem a história são interessantes e têm arcos consistentes.
O retorno das irmãs Sanderson é uma desculpa esfarrapada, mas o filme todo é uma desculpa esfarrapada, então até cai bem. E a forma como elas interagem com a modernidade é um grande acerto: o primeiro filme quase ignora o fato de que elas são bruxas de 300 anos atrás. Neste não: elas entram em lojas e fazem uso de invenções modernas que não só trazem boas piadas como acabam virando elementos importantes para o enredo.
Abracadabrizado
E é isso: é um filme infantil que tem a difícil tarefa de agradar e revitalizar uma história ultrapassada, dos anos 1990. E isso ele faz muito bem. É agradável, com uns chistes legais, um climão de bruxas, leve e aventureiro ao mesmo tempo.
Com certeza, quem for fã do primeiro filme vai curtir. Quem não for (eu não sou) pode gostar também. É um filme tão agradável que chega a ser uma pena ele não ser lançado no cinema. O defeito dele talvez seja em contar a história de um jeito tão legal que ele torna o primeiro filme ainda mais fraco do que eu já acho que ele era.
Podem assistir Abracadabra 2 tranquilos. Já quem não tiver Disney+ e quiser ver três velhas engraçadas da década de 1990; uma loira, uma ruiva, e uma morena; eu recomendo assistir a entrevista de Hebe, Nair Bello e Lolita Rodrigues no Jô Soares que vai ser um melhor aproveitamento do seu tempo.