Quem me Ama, me Segue! Comédia dramática francesa
Um tapa com luva de pelica na geração careta de pais de hoje em dia, que ameaça estragar o potencial empático e globalizado inerente aos nativos digitais que são os seus filhos (os millenials), Quem me Ama, me Segue! mostra que a geração hippie morreu, mas alguns representantes seguem ferrenhos na doçura ao lidar (e lidavam quando jovens) com a não-posse do corpo e do amor do outro (a despeito de lutar por esse amor).
Para fazer isso, o diretor José Alcala (de Alex) sustenta a história que quer contar em veteranos atores talentosos: Catherine Frot (Marguerite), Bernard le Coq (de Feliz Natal) e o “sem-palavras-para-descrever-como-é-bom” Daniel Auteuil, este último sempre elegante em suas encarnações de personagens humanos.
E ele, aqui, é Gilbert, um aposentado que procura manter sentido na vida após a aposentadoria. Aferrado a seu caminhão de reboque de seu antigo ofício de mecânico, ele está cada vez mais ranzinza e mais distante do viço romântico da juventude. Assim, ele cultiva cada vez menos o amor de Simone, sua esposa (Frot), a ponto dela se desinteressar por ele.
Quem me Ama, me Segue!
O curioso é que a nós é apresentado inicialmente não Gilbert e Simone, mas Étienne (le Coq) e Simone. Ou seja, é posto logo de cara que há um triângulo amoroso. Gilbert e Étienne são amigos de infância e vizinhos; Étienne é amante de Simone e Simone ama os dois.
Tudo está em equilíbrio (graças em grande medida ao esforço de Gilbert em fechar os olhos à traição física do amigo e da esposa para com ele) até que Étienne também se aposenta e resolve se mudar e curtir em outras paragens sua vida mais solta. Nesse momento, dispara-se o sentido do título do filme: é uma história de perseguições e de buscas.
Pra lá e pra cá
Simone opta por abandonar o marido taciturno e vai atrás do amante; isso dispara um desejo de movimento, de tal modo que, a dado instante, os dois homens passam também a ir atrás dela. Temos, então, uma incessante reflexão sobre autoestima, o amor buscado no outro e a aceitação de si, seus próprios desejos e os desejos do objeto amado. Psicanaliticamente falando, cabe ao objeto amado o papel de “deslocar” o amor no amante. É disso que este filme trata.
O que se defende é que essa movimentação interna e externa dos corpos demanda experiência de vida: um jogo para veteranos, pois é uma batalha exaustiva e que deve ser jogada com sabedoria. Há poucos jovens na trama, e cada um deles imerso em seus próprios problemas mais ou menos importantes. As duas gerações são abordadas como bem distantes, e as diferenças de idade entre elas são potencializadas, o que amplia essa sensação.
O novo e o velho
Em tramas paralelas, vemos a relação tempestuosa de Gilbert com sua filha e seu neto, fruto de uma relação com alguém que dispara em Gilbert um racismo que não morre; apesar do amor livre vivido e do engajamento em outros tempos e mesmo (em certa medida) nos atuais tempos, esse racismo não é extinto; não é falado, não é elaborado, é sufocado, mas é latente.
Filmes como Por que não? e A Mulher do Padeiro são citados pelo diretor como películas que dialogam com o seu Quem me Ama, me Segue! De fato, o mecânico Gilbert faz as vezes do padeiro do filme clássico de Marcel Pagnol, realizado em 1938, obrigatório para todo cinéfilo interessado na evolução do cinema francês.
Mas, se desejamos contrapor o velho com o novo, temos portanto um filme interessante da nova fornada francesa. As pinceladas de comédia geram risos nervosos por parte de um público que sabe que lidar com o amor nunca será tarefa, de fato, para principiantes.