A Bruxa do Amor – Muito mais que um exploitation
Elaine (Samantha Robinson) é uma bruxa jovem e moderna que, depois de se separar de seu marido, Jerry (Stephen Wozniak), viaja para uma cidade pequena, onde pretende buscar um novo amor.
Lá ela conhece Trish (Laura Waddell), uma designer de interiores, de quem Elaine se torna amiga e, com vários feitiços, conquista uma série de homens, enquanto tenta encontrar o amor da sua vida.
A fantasia masculina em A Bruxa do Amor
O filme acompanha Elaine, uma jovem bruxa, dos dias de hoje, que só quer encontrar um homem que a ame. O longa já começa utilizando o arquétipo da bruxa, que é uma das figuras mais poderosas das histórias infantis e que geralmente é retratada como vilã, mas que em trabalhos mais recentes, já é a representação de uma mulher independente e livre.
Na vida real, no entanto, várias mulheres foram acusadas, perseguidas e mortas por bruxaria, justamente porque não se enquadravam em padrões que a sociedade patriarcal considerava certa.
Aqui, Elaine é uma moça que resolveu aprender a arte da bruxaria depois de relacionamentos que deram errado e a personagem é repleta de dualidades: ao mesmo tempo em que ela é livre e faz o que bem entende, ela também é frágil e sonha somente em encontrar o amor da sua vida. Ela se posiciona, se veste e se maquia como uma mulher extremamente sensual, mas parece sempre depender da aprovação masculina.
Femme fatale
Elaine se encaixa perfeitamente na categoria da femme fatale e, como ela cresceu em uma sociedade machista, ela internalizou esse tipo de discurso e acha que deve cumprir todas as expectativas dos homens com quem ela se relaciona. Em muitos momentos ela diz que é “a maior fantasia” do público masculino, ao mesmo tempo que busca na bruxaria a sua própria liberdade.
O culto que Elaine frequenta lhe ensina a lidar com sua própria sexualidade de forma livre e sem julgamentos, o que é uma ideia feminista, no entanto, esse discurso é pregado por um homem que comanda o culto e que o filme dá a entender que abusou de Elaine e de outras mulheres do culto, quase como se ele fizesse esse discurso apenas na intenção de se aproveitar dessas jovens mulheres.
A masculinidade tóxica
Outro assunto que A Bruxa do Amor traz à tona é a masculinidade tóxica. Elaine pode ser uma moça que está procurando amor e que está disposta a mudar para manter um homem, mas ela também é uma bruxa poderosa, que através de seus feitiços consegue conquistar o homem que quiser.
O que acontece depois que ela os conquista é que é a grande questão do filme. Wayne (Jeffrey Vincent Parise), um professor universitário com quem ela se relaciona assim que chega na cidade, fica pegajoso e carente logo depois que eles fazem sexo; e Richard (Robert Seeley) fica tão obcecado por ela que não consegue prosseguir com sua vida. É quase como se o feitiço de Samantha liberasse todos os sentimentos que esses homens vêm guardando a vida toda.
Uma frase da diretora Anna Biller pode explicar essa trama com mais precisão: “Os homens são conhecidos por serem muito menos sentimentais do que as mulheres, mas, pela minha experiência, eles são muito mais emotivos. E é por isso que eles não conseguem, ou não podem abrir essa porta — isso os destruiria”. E é exatamente isso que acontece em A Bruxa do Amor, quando esses homens entram em contato com seus sentimentos, coisa que eles em geral evitam porque foram criados dentro de uma cultura de masculinidade tóxica, eles colocam tudo para fora de uma vez e se desesperaram.
Homens x mulheres
É interessante a maneira com que a própria Elaine se refere a esses homens depois que ela consegue ir para a cama com eles: “Ele ficou pegajoso”, “ele não sai do meu pé”, “ele é muito dependente”, “ele não quer mais fazer sexo”, que são reclamações que os homens muito frequentemente imputam às mulheres depois que as conquistam. Uma das frases de Elaine deixa isso ainda mais claro, “ele se comporta exatamente como uma garota”.
Aspectos técnicos de A Bruxa do Amor
O filme se apropria totalmente da estética do cinema dos anos 1960 e 1970 e em muitos aspectos lembra um filme de exploitation. A diretora, por outro lado, disse que a ideia não é essa, já que os filmes do gênero são voltados para o público masculino e que aqui a perspectiva é totalmente feminina. É quase como se o longa tentasse reverter esse gênero, dando espaço às mulheres para além da observação masculina.
Biller também acredita em trazer de volta o glamour da Hollywood antiga e que os figurinos, maquiagens e cenários vão atrair ainda mais o olhar feminino para o filme, que é o público alvo. É interessante notar que embora pareça que A Bruxa do Amor se passa nos anos 60 ou 70, porque todos os personagens usam roupas que remetem à época, o filme se passa nos dias de hoje e em alguns momentos vemos carros modernos e celulares.
As roupas de Elaine são de tons bem fortes e coloridos, enquanto os outros personagens geralmente usam roupas em tons pasteis, o que naturalmente destaca a protagonista. A palheta de cores do longa é inspirada nas cores dos filmes Technicolor, dos anos 60. O longa tem uma atuação que é tão teatral, que algumas vezes soa falsa, mas que funciona muito bem dentro do que ele se propõe, tudo se completa muito bem em A Bruxa do Amor. O longa conta ainda com a boa atuação de Samantha Robinson, que parece perfeita para o papel.
Vale tirar suas próprias conclusões
É óbvio que A Bruxa do Amor parte de uma ideia bem interessante e é um filme diferente, não só na sua trama, mas em toda a ideologia feminista que a diretora coloca por trás e que aqui, funciona muito bem. As mensagens, no entanto, não são transmitidas tão facilmente e a plateia tem a sensação de que o filme não consegue passar tudo que quer, como se tivesse muita teoria e pouca ação.
A Bruxa do Amor ainda é um filme instigante, que apresenta boas ideias e que se destaca em muitos aspectos, embora não consiga passar tudo o que deseja. O filme está disponível na Supo Mungam Plus.