O Livro dos Prazeres

“Amor será dar de presente ao outro a própria solidão?”, diz a personagem Lóri, parafraseando Clarice Lispector em certo trecho desse filme de Marcela Lordy, que adapta o livro “Uma Aprendizagem ou Livro dos Prazeres”, de uma das mais importantes escritoras da língua portuguesa.

O drama erótico acompanha uma professora que vive a monotonia de uma rotina de trabalho e relacionamentos furtivos até que conhece um professor de filosofia argentino, egocêntrico e provocador, com quem vive um flerte não consumado.

Simone Spoladore esbanja sensualidade seja em momentos isolados, seja em cenas de sexo com muita entrega e repletas de crueza, em uma atuação potente, melancólica e completamente identificável. À medida que o Ulisses de Javier Drolas desequilibra um pouco o jogo, com um personagem de falas decoradas e artificiais, mas que nunca estraga a experiência íntima da protagonista, que aprende a amar enfrentando sua própria solidão.

O Livro dos Prazeres

Resgatando o texto de Clarice nos momentos certos, Lordy sabe como explorar a figura de Spoladore seja nas silhuetadas da madrugada, ou nas belas tomadas de um Rio atemporal, povoado por figuras que buscam tirar Lóri de seu ostracismo existencial, mas que, como por óbvio, só depende dela para completar essa complexa jornada pessoal, onde a resposta reside tanto no outro (o amor que precisa ser consumado), quanto nela própria (a superação de um luto, o encaixe no novo ambiente e a aceitação de sua condição enquanto criatura).

O Livro dos Prazeres oferece assim momentos de tesão puro e de uma experiência sensorial singular, mas aprazível. A coprodução entre Brasil e Argentina conquistou o prêmio de melhor atriz e menção honrosa em longa metragem no 22º Bafici. O filme chega aos cinemas brasileiros hoje, 22 de setembro, junto com a primavera.