Cordialmente Teus
O diretor de teatro Almir Labaki estreia na telona com Cordialmente Teus, projeto que ele aceita pelo prazer do desafio de amarrar dez histórias curtas ambientadas no Brasil do passado, do presente e do futuro (entre 1566 e 2066), que contam situações diferentes entre si, mas que na essência discutem a violência naturalizada em nossa cultura das mais variadas formas.
O filme consegue ser ousado e com resultados pouca coisa irregulares, bem menos irregulares do que se suspeitaria para um debut numa linguagem artística qualquer, muito por conta da experiência de Labaki com a direção de atores em palco.
A escolha do elenco favoreceu: atores e atrizes que têm entrosamento com o diretor e que confiam na sua condução (sensação particularmente clara quando assistimos rodas de conversa em que estão presentes toda a equipe do filme).
Cordialmente Teus
Os pequenos contos passam por situações variadas: um português que tortura um indígena para que ele lhe seja leal; uma cliente de banco revoltada com a gerente da agência; uma viúva que perde a sua fortuna por mau uso de seus investimentos; um pai e um filho discutindo sobre política em uma mesa de jantar; e por aí vai.
Este é um filme sombrio. Como os sketches se passam fora de ordem cronológica, há uma leve sensação de desesperança: as mazelas culturais de nossa sociedade sempre existiram, existem e existirão, e nada é proposto ou elaborado para que isso se resolva.
Para alguns dos atores presentes no longa, é uma recompensa: o justo reconhecimento pelo público do cinema dos bons serviços prestados nos palcos de nossos teatros. E eles dão conta de passar a ideia geral de que pouco há o que se fazer para resolver nossos problemas estruturais (ou não temos interesse em fazer, já que o filme também não demonstra interesse em propor soluções, como citado anteriormente).
Cidadania sempre em construção
A grande quantidade de histórias contadas pode ser explicada pela necessidade do autor em mostrar todas as suas angústias sociais; poder-se-iam criar outras passagens além das que vemos no filme, mas um aumento exagerado no número delas, ao mesmo tempo que cansaria o(a) espectador(a), tornaria mais difícil o já complicado processo de amarrar todas as tramas vistas.
O que posso destacar como negativo são as falas declamadas durante todo o tempo, como se a veia teatral de toda a equipe precisasse ser exibida ao nível de não deixar quaisquer dúvidas sobre suas origens. Acaba soando artificial e chato, com exceção da única cena em que, na nossa programação mental, faria sentido que os personagens conversassem de um jeito mais empolado, que é o momento passado em 1891.
Gostei do filme Cordialmente Teus. É um filme de um diretor com personalidade, uma proposta interessante de se contar a História do Brasil de uma perspectiva vista de baixo, provavelmente exalando o interesse do veterano Labaki em discutir política de um jeito mais próximo do povão que sofre as consequências de nossas crises culturais. O que falta agora é o que falta para a elite intelectual brasileira, da qual Labaki também faz parte: explicar as coisas de um jeito um pouco menos sofisticado.