Os Caubóis do Apocalipse
A primeira lição que aprendi como contador de histórias é narrar algo que gostaria de assistir. Se eu gostar, a chance do público a quem direciono a trama curtir, também é grande. Diego Da Costa também sabe disso e conduz aqui uma narrativa sensível, engraçada e que diz muito sobre ele antes de tudo, e por isso mesmo mira certo no coração de seu público.
O diretor e boa parte da equipe de produção, foram meus amigos de infância e adolescência, parceiros estes que me iniciaram nas campanhas de RPG, nas disputas de videogame aos finais de semana, que eu ainda acompanhei quando formaram a primeira banda.
Em Os Caubóis do Apocalipse, que já conquistou mais de 5 prêmios, entre eles o de Melhor Filme no 8º CivFilmes, Tom é um adolescente que sonha em retomar sua banda de rock com Nanda e Dedão (a que dá título ao filme). Quando descobre que a garota passou no vestibular e vai deixar a cidade, o rapaz tenta reunir os amigos para gravar um clipe no sítio de sua família. Porém, ao perceber que as coisas não vão bem, resolve pedir ajuda ao caseiro Chicão, que acaba complicando ainda mais a situação.
Filmado todo em Socorro, interior de SP, minha cidade natal, ao qual retornei em 2016 (aliás, mesmo ano de início de produção de Caubóis), o longa explora bem famosos cenários locais, como outros tantos menos conhecidos, sempre em favor da narrativa que não tem pressa em se desenvolver e vai revelando seus propósitos a medida que avança.
Brás Moreau Antunes faz o protagonista egoísta e aflito, que tenta forçar a reunião de velhos amigos antes que a independência alcance um deles e a antiga turma se desfaça em nome da evolução natural da vida, onde novas amizades e oportunidades surgem, separando aquilo que não deveria. O rapaz, magrelo e trapalhão, por vezes me remeteu a uma versão caipira de Scott Pilgrim (ao qual a cena inicial referencia de maneira certeira), incluindo aí uma certa ingenuidade fantasiosa, que funciona dentro do plot meio onírico, meio inocente que a trama pede. Rafael Imbroisi por outro lado, usa da carranca e do mal humor para entregar um personagem que se força a distanciar de tudo, mas que no fundo ainda se prende aos elos do passado mesmo que de maneira improvável. O Chicão de Dagoberto Feliz, traz uma figura ora cômica ora assustadora, que é o grande responsável pelo andamento do roteiro. Cacá Ottoni, de longe a melhor do elenco, é o coração do filme e sua naturalidade enquanto Nanda nunca parece atuação, o que me soou bastante justo para alguém que levou o prêmio de Melhor Atriz no 7º FestCine Maracanaú. Por fim, o trio composto por Paulo Victor Pinheiro, Marco Reis e Leonardo Costa de Sá, assume a tarefa pelo melhor humor do longa, em uma trama paralela envolvendo javaporco, muita maconha e larica, em situações que lembram ora os melhores momentos dos Trapalhões, ora Férias do Barulho (ou o mais recente Madrugada Muito Louca).
Entre os grandes trunfos de Os Caubóis do Apocalipse, temos primeiramente a fotografia, que faz um excelente uso da iluminação ambiente, tanto para cenários internos quanto dos panoramas externos que favorecem as belas paisagens de Socorro, a medida que colabora para a narrativa — que necessita muito de alguns momentos contemplativos e de silêncio. Em segundo lugar, a aposta do diretor em seus atores, permitindo a eles longas cenas de diálogos sem cortes, onde a fluidez do sentimentos fica mais evidente e real para o espectador, que se identifica quase o tempo todo com as figuras em tela. A trilha sonora é outro elemento essencial no enredo, de um trabalho intimista e envolvente que merece ser conferido mais de uma vez, juntamente com toda a edição de som, brilhante em muitos pontos.
Os Caubóis do Apocalipse
Os Caubóis do Apocalipse poderia ter meia hora a menos, mas mesmo assim faz bom uso da duração entregando uma história sobre pessoas acima de tudo, que fala sobre o fim da juventude de maneira simples e singular, com uma identidade interiorana que estava fazendo falta no cinema nacional.