O Animal Cordial, um filme visceral
O Animal Cordial – São Paulo. Inácio é o dono de um restaurante de classe média, por ele gerenciado com mão de ferro. Tal postura gera atritos com os funcionários, em especial com o cozinheiro Djair. Quando o estabelecimento é assaltado, o dono e a garçonete precisam encontrar meios para controlar a situação e lidar com os clientes.
Da abertura aos créditos finais, O Animal Cordial é um filme tenso, sanguinário e verdadeiro. Dessa forma, em poucos minutos entendemos que existe uma relação difícil entre patrão e funcionários. Inácio (Murilo Benício) parece estar à beira de um colapso nervoso, com uma esposa que cobra sua presença através do celular, funcionários que precisam ir embora por conta do horário e clientes arrogantes que chegam tarde da noite. Já os empregados da cozinha, liderados por Djair (Irandhir Santos), querem bater de frente com o patrão, indo contra suas ordens e passando com o lixo em frente aos clientes.
O Animal Cordial
Clientes esses que não são fáceis. Amadeu (Ernani Moraes) é um policial aposentado que bebe uísque ao longo da noite e pede um prato diferenciado: carne de coelho. Bruno (Jiddu Pinheiro) e Verônica (Camila Morgado) são típicos ricos esnobes, que não levam à sério a escolha do vinho feita por Inácio, desdenham do atendimento de Sara (Luciana Paes) e pedem carne de javali.
Como se não bastasse o clima pesado no local, com uma música superficial dando um toque impessoal ao restaurante, somos surpreendidos com um assalto à mão armada (infelizmente, algo que acontece muito em São Paulo). Entram em cena Magno (Humberto Carrão) e Nuno (Ariclenes Barroso), assaltantes inexperientes que chegam loucos por violência, atacando Verônica, apontando a arma para todos, mas… a coisa muda de figura quando quem tem a verdadeira arma é Inácio, que, esperto, atira em Nuno e toma as rédeas da situação.
Curiosidades
O Animal Cordial já foi premiado em vários festivais nacionais e internacionais. No Festival do Rio, recebeu o Prêmio de Melhor Ator para Murilo Benício. No Fantaspoa, maior festival de cinema fantástico do Brasil, ganhou os prêmios de Melhor Atriz para Luciana Paes e Melhor Direção para Gabriela Amaral Almeida. Mesmo sendo um filme do gênero slasher, o longa traz questionamentos quanto às relações trabalhistas, a necessidade de ascensão do ser humano, o controle que ele exerce sobre o outro a partir da violência, entre outros pensamentos.
De acordo com Rodrigo Teixeira, o produtor, O Animal Cordial é um projeto que nasceu de um susto, uma febre da diretora Gabriela Amaral Almeida, que teve o insight quando almoçava em um restaurante e descobriu que o mesmo havia sofrido um assalto há poucos dias. Isso serviu de inspiração para que ela escrevesse a história em 48 horas intensas de ideias sobre como o medo, a violência e a segurança (ou a falta dela) vendem bem.
A vida como ela é
Não há clichês, os personagens são representados como pessoas normais, que erram, que tomam decisões precipitadas e que poderiam muito bem ser aquela pessoa ao seu lado no ônibus pela manhã. O estado de confinamento traz à tona comportamentos que não acreditamos que possam estar dentro de nós. Afinal, o título já nos traz essa incompatibilidade, uma palavra que anula a outra: como podemos ser cordiais quando somos tão animais?
Tanto Inácio, refém da masculinidade e do poder, quanto Sara, carente de afeto, mostram seus verdadeiros espíritos animalescos nessa história de horror com atmosfera entorpecida, que, mesmo com tanto sangue envolvido, consegue ser bela e desconcertante. A sessão acaba então com todos impactados pelo que assistiram na tela. Assim, quase não há espaço para respirar de tão intensa que é a experiência. Ah, o filme é 18+, certamente.