Ad Astra – Muito Brad Pitt e apuro científico
Espaço; uma trilha sonora cheia de crescendos; efeitos de Lens flare. O filme Ad Astra, que estreia por aqui dia 26 de setembro, com o lamentável redundante subtítulo de “Rumo às Estrelas” (que é o significado do título em latim), tem esses elementos escancarados logo na primeira cena – e basicamente continua com eles até as exibições dos créditos finais.
Na história, que se passa em um futuro não tão distante, um inspiradíssimo Brad Pitt interpreta o Major Roy McBride, cujo pai está há quase duas décadas desaparecido, após ter saído em uma missão que envolvia comprar cigarros em Netuno (alguma coisa assim). O major então é mandado para Marte, na base fixa humana mais distante da Terra e mais perto do seu pai (do dele, não do seu), para mandar uma mensagem para os confins do Sistema Solar.
A sinopse já apresenta este imenso furo de roteiro que acompanha toda a película. Por que diabos o major precisa ir a Marte para mandar a mensagem? Ele poderia enviar um áudio de WhatsApp da Terra mesmo, ou um torpedão de voz, ou até mesmo gravar um CD e enviar por DHL (que chegaria pelo menos na lua, aparentemente).
Ad Astra e sua parte “científica”
Mas a história precisa andar e dá pra ignorar esse plot hole em troca de assistir uma ficção científica de primeira, daquelas que geram assunto suficiente para alimentar o twitter do Neil deGrasse Tyson por meses. Os nerdzinhos entusiastas da ciência espacial vão adorar Ad Astra. Desde quando Andy Weir escreveu “The Martian” que uma obra não fomentava tanto uma discussão científica.
O filme tem de tudo. Bases turísticas extra-terrestres, viagens para Marte que duram menos de um mês (atualmente o tempo estimado é entre três e sete meses – já escrevi sobre isso), torres que atingem a exosfera, regras de comportamento universais no espaço, piratas lunares, viagens pelo sistema solar que duram meses. Ao sair do cinema, minha vontade era de vasculhar o Reddit atrás de discussões científicas sobre as possibilidades futuristas tecnológicas que o filme apresenta, de calcular a aceleração das naves, estimar o tempo que cada viagem demoraria.
Uma das qualidades científicas é justamente que o filme não entrega todas as respostas e deixa espaço para discussão. Mesmo tocando em temas que hoje consideramos fundamentais para essa nova era de exploração espacial, como a psicologia. Ao contrário das viagens relativamente curtas que almejávamos na década de 60, os planos espaciais de hoje em dia envolvem meses de isolamento. Ad Astra entende isso: o filme é também uma obra sobre solidão. E aí que Brad Pitt brilha.
Brad Astra
Apesar de ter nomes de peso no elenco, Brad Pitt é a única grande estrela do filme, e ninguém mais parece relevante. Presente em absolutamente todas as cenas, ele se entrega com uma atuação sutil, mas marcante. Com dois trabalhos memoráveis no ano (ele também está excelente em Once upon a time in… Hollywood), cada um com sua devida cena sem camisa, ele está definitivamente bem cotado para uma indicação ao Oscar.
Ficções científicas espaciais parecem depender sempre de um ator dominando a tela, lutando pela sobrevivência. É assim com Matt Damon em Perdido em Marte e com Sandra Bullock em Gravidade. E mesmo que em Ad Astra o roteiro não colabore para que o público crie uma ligação forte com o personagem, Brad Pitt executa com maestria essa responsabilidade.
Apuro técnico
Mesmo a parte visual sendo bem cuidada, o que mais marca em Ad Astra é sua edição sonora. Seguindo o apreço científico já explorado por Alfonso Cuarón em Gravidade, as leis da física são respeitadas nesse quesito. As explosões no espaço não emitem barulho e os efeitos sonoros são ouvidos como se estivéssemos escutando-os pelo meio de propagação de suas ondas. Se no espaço há uma batida em um metal ao qual um ator esteja ligado, por exemplo, tem seu som abafado, como se tivesse se propagado por aquela superfície e chegado aos ouvidos do personagem por meio de sua ligação a ele.
Por conta disso, durante mais de uma cena, eu desejei que a trilha sonora não interferisse tanto nos demais efeitos de som. Mesmo que isso implicasse em momentos de completo silêncio.
Da mesma forma que a música parece preencher mais espaço do que devia, outra técnica visual chega a ser cansativa: a de lens flare, esses raios que atingem a câmera quando um emissor de luz é filmado. O filme abusa fortemente do efeito, de um modo que até J.J. Abrams poderia achar exagerado.
…and beyond
Apesar dos furos, da ausência de piadas com “Uranus” e do roteiro apenas mediano, Ad Astra conquista os fãs de ficção científica pelas questões levantadas e tecnologias imaginadas. Por não responder a todas as questões e nem mesmo se preocupar com isso, é o filme perfeito para ver com os amigos e depois discutir na mesa de bar. A trama nos deixa imaginar como será o turismo espacial daqui alguns anos; que tipo de bases extra-terrestres nós podemos construir; ou por que diabos os cachorros ainda topam ir pro espaço mesmo depois do que fizemos com a Laika?
Tudo isso, pelo menos, enquanto o Neil deGrasse Tyson não aparece no twitter escancarando todas as imprecisões e impossibilidades físicas do filme, estragando o divertimento de todo mundo.
Fantástico! Fiquei curioso 🙂