As Crônicas Marcianas, de Ray Bradbury
Os anos 50 imaginam os anos 2000
As Crônicas Marcianas é uma novela epistolar que retrata a chegada da humanidade à Marte, os primeiros contatos com os marcianos e a colonização do planeta, ao mesmo tempo que a Terra está prestes a sofrer um ataque químico. A primeira coisa que salta aos olhos no livro é a sua estrutura. Ele é escrito de maneira epistolar, ou seja, é composto de uma série de contos que, quando lido juntos, formam um romance.
Os contos nem sempre tem os mesmos personagens ou se passam na mesma época. Na edição original as histórias do livro começam em 1999 e terminam em 2026; já na edição de 1997, as datas foram avançadas em 31 anos e, por isso, as histórias começam em 2003 e vão até 2057- mas todos abordam a chegada do homem à Marte e o que acontece a partir disso.
Através dessa ideia, Ray Bradbury não só conta uma série de histórias diferentes, como também consegue trazer várias questões à tona. Assim como a maneira com que o ser humano trata o planeta e, consequentemente, qualquer outro planeta que ele vier a descobrir; a colonização e as descobertas espaciais.
As Crônicas Marcianas
O livro foi publicado em 1950, dezenove anos antes do homem pisar na lua, portanto o espaço ainda era um mistério completo. No entanto, o livro mostra que é bem da sua época, uma vez que circunda temas que estavam na moda nos anos 50 e que se firmariam mais ainda nos anos 60, como as viagens espaciais, as invasões alienígenas e o medo da bomba atômica. As Crônicas Marcianas faz parte daquele período em que as pessoas gostavam de imaginar como seriam os anos 2000, que pareciam extremamente longínquos.
É por isso que os contos de As Crônicas Marcianas começam em 1999 e se estendem por boa parte dos anos 2000. Bradbury então, coloca seu leitor dentro de todas as expedições que vão para Marte e vai nos contando o que aconteceu. Entre os acontecimentos estão alienígenas amigáveis e alguns nem tanto, cientistas que decidem viver em Marte, explorações humanas e até uma dizimação marciana em função de uma doença levada pelos humanos.
É assim que Bradbury fala de questões que dizem muito mais respeito à Terra e ao comportamento humano do que a Marte. Enquanto os humanos exploram o planeta vermelho, a Terra vem decaindo e está frente a frente a um ataque nuclear. Na época em que o livro foi publicado nem se falava em aquecimento global ou na extinção das espécies, mas quando o autor coloca um tema como esse no livro, ele inevitavelmente ecoa nos dias de hoje e talvez com ainda mais intensidade.
O que fazemos com o nosso planeta
E uma vez que o autor fala que a Terra está ameaçada por uma guerra nuclear, ele também fala sobre a ganância da raça humana, que acha mais plausível destruir um planeta inteiro porque não consegue concordar entre si.
Os humanos então, começam a colonizar Marte, e transformá-lo na “Nova Terra”, o que dialoga com uma questão que está mais próxima de Bradbury e da época em que ele escreveu o livro, afinal, uma série de países colonizou outros países, buscando mudar os costumes dos nativos e inserir os seus, mesmo que para isso fosse necessário matar e dizimar.
Nas histórias de As Crônicas Marcianas, os humanos decidem que não foi suficiente fazer isso no seu próprio planeta, mas que também é necessário repetir o processo em outros. O livro também tem uma série de referências a outros livros, como alguns contos de Edgard Allan Poe, no conto Usher II, ao Mágico de Oz, no conto Interim e ao livro Fahrenheit 451, do próprio Bradbury.
As Crônicas Marcianas na mídia
Embora esta seja uma obra relativamente conhecida, não é o livro mais famoso de Bradbury e parece ter mais apelo entre os leitores de ficção cientifica ou fantasia. Talvez por isso o livro nunca tenha ganhado uma adaptação cinematográfica e, embora tenha sido adaptado para outros meios, não tenha tido grande projeção.
As Crônicas Marcianas inspirou a série de ficção cientifica para o rádio, Dimension X, e em 1979 virou uma minissérie, que aqui no Brasil ganhou o nome de Planeta Vermelho, estrelada por Rock Hudson, Darren McGavin, Bernadette Peters e Roddy McDowall. Bradbury, no entanto, classificou a série como “chata”.
Já mais recentemente, em 2011, o livro ganhou uma versão em quadrinho feita por Dennis Calero e com introdução do próprio Bradbury. Aqui no Brasil, a HQ foi publicada pela Globolivros.
O interessante de As Crônicas Marcianas é que o livro descreve situações que, na concepção de Bradbury, estariam acontecendo nos dias de hoje (e no caso da edição mais antiga, já teriam acontecido há algum tempo) e é sempre interessante ver como que os escritores dos anos 50 imaginavam como seriam os anos 2000.
Talvez Bradbury não tenha acertado suas previsões, assim como acontece em Fahrenheit 451, mas As Crônicas Marcianas se mantém como um ótimo livro sobre a exploração de Marte. Os contos misturam fantasia, ficção científica, terror e suspense e ainda apresentam uma abordagem diferente de outros livros sobre o assunto.
E uma vez que a humanidade ainda não chegou a Marte, quem pode garantir que Bradbury não estava mesmo certo?