Conan, o Bárbaro, de Robert E. Howard
Leitura obrigatória para qualquer apreciador de fantasia, os contos de Conan reunidos neste primeiro livro (de 3), não só são importantes pelo canône do gênero, como riquíssimos em qualidade narrativa, de construção de mundo, fornecendo o melhor tipo de aventura, daquela autêntica que não se envergonha do que é.
Ainda que o cimério seja mais famoso por suas retratações nos quadrinhos e no cinema, em obras que respeitaram parte da sua essência (ainda que o ícone tenha gerado também games, RPGs e outros badulaques, tendo ainda inspirado inúmeros genéricos), foi na literatura que Conan nasceu.
Literatura esta com personalidade, de uma escrita poderosa e inventiva, de um dos maiores autores de seu tempo, avô da fantasia épica como a conhecemos em todas as vertentes posteriores — que nunca teve o devido mérito, a não ser pelos fãs de seu nicho. Tolkien não teria sequer arranhado a saga do Anel se Conan não o precedesse — estão ali as formações de batalha, o elemento fantástico apresentado de maneira natural dentro dum contexto onde isso é absurdo, as construções de frases e elementos narrativos, que hoje são clichês, ali sendo inaugurados com precisão.
Mesmo em seu curto tempo de vida, abreviado aos 30 anos por um suicídio cinematográfico, Howard fundamentou todos os tropes do gênero e fez isso de uma maneira que, até hoje, mesmo mais de setenta anos depois, ainda é melhor literatura do que muito best-seller por aí. Com Conan, Howard inaugurou o subgênero Espada & Feitiçaria (cunhado por seu contemporâneo Fritz Leiber) e deixou sua marca para sempre.
Neste, que é o livro mais lindo de 2017, com capa dura e película de acetato com o título sobreposto, e uma diagramação e material gráfico primorosos, é evidente o trabalho apaixonado da Pipoca e Nanquim no material, que ainda que não seja inédito no país (já tendo versões pela Conrad e Generale), tem aqui sua versão definitiva e uma das mais incríveis do mundo, incluindo aí a criatividade da edição, singular em vários sentidos; além da capa formidável do mestre Frank Frazetta, a obra é recheada com ilustrações lindas e pontuais do grande Mark Schultz, que soube expressar cada trecho de história de maneira a amarrar com o que estava sendo narrado. Os contos também foram colocados na exata ordem em que foram escritos originalmente (com direito a capa da Weird Tales e tudo, o que denota o cuidado também com o fator histórico da produção). Alexandre Callari é um dos maiores fãs vivos do cimério e essa paixão e extremo conhecimento do personagem e seu universo, ficam evidentes tanto na introdução inspiradíssima, como na tradução acertada, que soube colocar no nosso idioma todo o poder das palavras que Howard usava em sua narrativa.
Em A Fênix na Espada, de longe o melhor conto do primeiro livro, temos acesso a um velho e já rei Conan, apresentando também um dos melhores vilões de seu universo e colocando o bárbaro diante de um horror impronunciável, cheio de artimanhas inventivas. A Cidadela Escarlate, por sua vez, fundamenta o princípio da narrativa épica, com batalhas e formações de guerra de encher os olhos. Howard flerta com a reflexão, sem perder o tom, no curioso clássico A Torre do Elefante; enquanto que em O Colosso Negro ele fornece o melhor do horror (emprestando elementos de seu colega, H.P. Lovecraft). Xuthal do Crepúsculo traz um Conan mais familiar pra quem o conheceu nos quadrinhos, bárbaro, impaciente e pegador, numa enrascada das boas. Por fim, O Poço Macabro entrega o melhor da fantasia pulp, sempre com saídas inesperadas.
O livro ainda traz o belo poema épico Ciméria, e um rico e interessantíssimo ensaio do autor intitulado Os Anais da Era Hiboriana — que revelam o quanto de controle ele tinha do próprio mundo que concebeu, tratando o cenário com respeito, inventividade e com exímios detalhes, que quase o fazem parecer real (além dos paralelos que ele traça com nosso atlas). O Deus na Urna é um conto extra, rejeitado na época de sua escrita e só lançado após a morte do autor, que colocam um jovem Conan como coadjuvante numa instigante trama investigativa, que deixariam Sherlock Holmes orgulhoso. A biografia de Howard encerra a obra.
Conan, o Bárbaro, de Robert E. Howard
Conan, o Bárbaro, não só é uma edição caprichada que merece figurar em sua estante, como você também merece ler o melhor já feito na fantasia. Afinal, mesmo tanto tempo depois, Howard e Conan ainda não foram superados.