Crítica: Death Note
A adaptação americana de Death Note chega ao Netflix nessa sexta-feira, 25 de agosto de 2017, após anos de dificuldades técnicas e adiamentos. Uma das polêmicas mais recentes envolvendo o projeto é a questão do whitewashing (a substituição de personagens que originalmente são de uma etnia – asiática, no caso – por brancos), que vem sendo discutida por grande parte da mídia especializada, tal qual foi feito com A Vigilante do Amanhã, no começo desse ano. Antes de entrar na crítica em si, gostaria de já deixar claro que, apesar de concordar com a necessidade de se discutir a representatividade no cinema, esse tipo de problematização não será levado em consideração no meu texto. Vale dizer também que não farei comparações com os mangás, o anime e as versões japonesas em filme da obra. Enfim, estou avaliando essa obra pelo que ela é.
Death Note conta a história de Light Turner (Nat Wolff), um brilhante estudante do ensino médio que certo dia se depara com um caderno mágico que dá ao seu dono o poder de matar qualquer pessoa do mundo cujo nome seja escrito em suas páginas. Com a ajuda de uma colega de sala, Mia (Margaret Qualley), ele assume a persona de Kira e começa a fazer justiça com as suas próprias mãos, livrando o mundo de criminosos que não foram pegos pelo sistema judiciário. No entanto, seu pai (Shea Wiggum), um policial com um estrito código de ética, começa a trabalhar no caso e se une ao misterioso detetive prodígio conhecido apenas como “L“. Juntos eles tentarão a qualquer custo descobrir a verdadeira identidade de Kira e acabar com seus assassinatos.
Quando, em meados de 2015, foi anunciado que a direção do filme ficaria por conta de Adam Wingard, meu grau de expecativa em relação ao filme foi às alturas, já que ele dirigiu alguns dos melhores thrillers de horror dessa década (Você é o Próximo, de 2012, e O Hóspede, de 2014). E eu não estava errado, já que o diretor conseguiu imprimir uma estética bem interessante ao filme: em certos momentos, parecemos estar diante de uma “dramédia” adolescente à la John Hughes. Em outros, temos cenas de morte muito bem feitas que trazem à lembrança os melhores momentos da série de filmes Premonição. A trilha sonora original de Atticus Ross (vencedor do Oscar de Melhor Trilha Sonora por A Rede Social) também contribui positivamente com o filme com seus timbres retro-futuristas, além das ótimas escolhas de faixas obscuras dos anos 80 que entram no momento certo (se você assistiu O Hóspede, já entendeu do que estou falando).
Infelizmente os talentos de Wingard como diretor e Ross como compositor não são nem de longe equiparados pelo de Jeremy Slater como roteirista, que deixa muito a desejar com um texto fraco e de ritmo desnecessariamente acelerado, sem espaço para um desenvolvimento apropriado dos personagens, dificultando a identificação por parte do público. A relação entre Light e Mia, por exemplo, evolui de forma apressada e pouco crível. A forma como Light lida com o seu pai só faz o garoto parecer um pivete ingrato. L é uma figura irritante, que se porta como um adolescente mimado e explosivo e cujos trejeitos peculiares definitivamente não foram bem transpostos para essa versão da história. E a sequência final do longa…bem, prepare-se para rir muito. Ou para quebrar a televisão de raiva.
Como se isso não bastasse, o filme é cheio de performances fracas. Nat Wolff não convence como Light, e sua fraqueza dramática fica clara nas cenas em que precisa demonstrar raiva ou medo. Margaret Qualley também decepciona como Mia, e isso é particularmente irritante, já que na excelente série The Leftovers, da HBO, ela fazia um papel com muitas similaridades, mas de maneira primorosa (provavelmente devido à qualidade superior do texto da série). No entanto, a performance mais decepcionante do filme fica por conta de Lakeith Stanfield como L, aquele que tinha potencial para ser o personagem mais interessante do filme.
A única atuação verdadeiramente boa é a de Willem Dafoe como Ryuk, o deus da morte que passa acompanhar Light após tomar posse do caderno. Não só os efeitos visuais ficaram interessantes no contexto do filme, mas Dafoe se mostra confortável ao encarnar um personagem que anda sempre na linha entre o ameaçador e o engraçado, gerando no espectador uma gama variada de sentimentos em relação à sua presença no filme. O fato de que seus rosto está quase sempre embaçado ajuda, ao mesmo tempo, a deixá-lo mais assustador e a disfarçar o uso da computação gráfica (a qual, aliás, só é usada no rosto de Ryuk, sendo que o resto do seu corpo é interpretado por um ator com uma fantasia – muito bem feita, por sinal).
No fim das contas, Death Note não é o desastre cinematográfico que havia sido premeditado por tantos, mas sim mais uma grande decepção oriunda da Netflix, plataforma que vem cada vez mais deixando a desejar no que diz respeito à qualidade de suas obras originais. Felizmente a animação de Death Note completa também está disponível no serviço. Essa sim é boa do começo ao fim.
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