Encanto
O novo filme da Disney, “Encanto“, é mágico. Mágico, incrível e lindíssimo, pronto, eu precisava tirar isso de mim, não queria deixar para muito tarde nesse texto, a juventude de hoje fica com preguiça de ler, então já fica aí a conclusão, podem voltar pros seus tik-toks com vídeos de 20 segundos, eu sei que vocês querem.
Mas também, o adjetivo “mágico” parece ser redundante quando se fala de um filme dos estúdios mais mágicos do mundo. A Disney cresceu criando magia, numa fórmula tão antiga que parece absurdo ainda tentar insistir nela. Talvez fosse coerente afundar um pé na realidade, apelar à sátira, ir no caminho que a Pixar consolidou lá no começo, com histórias mais sóbrias, mas “Encanto” vai no caminho contrário: é o filme mais mágico da Disney em muito tempo.
Encanto colombiano
O filme se passa na nossa vizinha Colômbia, constantemente representada: nos costumes, roupas, comidas, flora, fauna e cores. Uma família mora em uma casa sapiente e isso é só metade da magia: há uma vela que nunca se apaga e cada pessoa da família é abençoada com um poder quando chega a certa idade.
E é isso: é uma história sobre relações familiares. Não tem vilão, não tem grandes perigos globais. Eu entrei na sala de cinema sem saber nada do filme e com 10 minutos eu já estava completamente imerso na história. Os poderes mágicos de cada membro da família são intimamente conectados com suas personalidades e se complementam entre si. Não há excessos nesse sentido e tudo é lindamente costurado. O resultado é o que toda série de grupinho de heróis da Netflix quer ser, mas nunca consegue.
Encanto visual
A qualidade da animação tem sido uma constante nos estúdios Disney. Graficamente falando, “Encanto” não traz nenhuma grande novidade nessa área, mas a tendência é que as melhorias sejam tão sutis que passem despercebidas. Animação já é commodity e todos os grandes estúdios já dominam todas as principais técnicas.
A questão é sobre como essas técnicas são aplicadas e “Encanto” é uma das obras mais lindas da Disney: é tudo extremamente colorido, com magia brotando de todos os lados. A ação é divertida e os números musicais são um deleite, seguindo o mesmo caminho (e não por acaso) de Moana. Ao invés de apenas colocarem os personagens cantando ali no momento, o filme se permite ser fantástico nesses momentos, e os clipes de música são frenéticos, caóticos, e cheios de ação. Acompanhados por músicas excelentes: e esse tópico é um dos que mais me chamou atenção nesse filme.
Encanto musical
Na parte musical, a Disney repetiu a parceria de sucesso de Moana e chamou o Lin-Manuel Miranda para compor as canções do filme. Com a diferença que, de 2016 para cá, o compositor se tornou um fenômeno e o nome do cara foi amplamente divulgado em diversas campanhas de marketing.
A versão exibida para a imprensa foi dublada e o trabalho de tradução e localização da empresa continua soberbo. Não consigo imaginar a dificuldade que deve ter sido não só traduzir as rimas extremamente inteligentes de Lin-Manuel como deixá-las em sincronia com a ação maluca e desenfreada que ocupa a tela durante os números musicais.
Porém, como fã de Hamilton, eu aguardei curioso pela divulgação da trilha sonora original, principalmente porque eu já havia gostado da versão dublada e já tinha conseguido sacar alguns dos vícios de Lin-Manuel, como aquele rapzinho esperto astutamente posicionado no meio da canção.
Por mais que o trabalho de tradução seja muito competente, nem tudo se encaixa e a sonoridade de alguns refrões não soa tão boa na dublagem (como um “ele fa-lou“, que não cabe na batida de “he told me” e destoa bastante na canção). Mas isso é puro preciosismo de fã e só serve para dizer que, se vocês curtem Hamilton, vale a pena buscar as raras sessões legendadas.
Como resultado, das oito músicas originais do filme, algumas delas são bem marcantes, seja pelo ritmo bem latino, meio hip-hop-lambada ou seja pelo fato que não podemos falar de Bruno. A minha favorita, “Surface Pressure“, tem até potencial para ser um hit pop – e já foi para a minha playlist de favoritos do Spotify.
Encanto encantador
Essa combinação faz de “Encanto” um dos melhores filmes da era da Segunda Renascença da Disney (que são os filmes de 2010 até hoje). É minha principal aposta para o Oscar de melhor animação (achei bem melhor que “Luca” e “Raya…”) e talvez até um de trilha sonora original – não seria surpreendente.
O resultado é um filme perfeito para toda a família, mesmo que as crianças não entendam por que a mãe chorou por duas horas em uma obra tão viva e colorida.