Game of Thrones – 8ª e última temporada
O desfecho morno e agridoce de um dos maiores marcos da cultura pop atual
![](https://vitaminanerd.com.br/wp-content/uploads/2019/05/Game-of-thrones-capa.png)
Depois de três primeiras temporadas excelentes, Game of Thrones foi, evidentemente, se descaracterizando dentro do que se propunha. Gerou desapontamentos tanto entre os fãs quanto no próprio elenco, desde a sexta temporada. Atropelando ocorrências e abandonando elementos, a produção se enriqueceu na escala, no CGi e na direção de arte, mas perdeu em desenvolvimento de personagens, em narrativa coesa e passagem de tempo.
Tudo isso culminou em uma season finale apressada que poderia ter se dividido em duas. Assim, talvez a oitava fosse dedicada ao combate contra o Rei da Noite e a nona contra os exércitos de Cersei. Mas não estou aqui para pensar em “como deveria ter sido” e sim analisar como foi.
Já desapegado emocionalmente da série e ainda um fã confesso e apaixonado dos livros, relevei o desvínculo que a HBO fez do material original. Então comecei a interpretar a produção pelo o que ela é: um bicho próprio. Dessa maneira, por mais que o surto de Messias (e não “loucura”) de Daenerys não se justifique na oitava temporada, ele de fato foi estabelecido em todos os anos anteriores. Infelizmente o roteiro não soube como trabalhar isso, mas dentro de sua mediocridade, ainda conseguiu subverter as expectativas e colocar uma das heroínas da história como uma grande vilã.
Game of Thrones – 8ª Temporada
Note que ualquer leitor dos livros ou fã de GoT sabe que o enredo sempre se valeu justamente pela subversão. Moldar uma intenção, para depois quebrá-la e assim surpreender o público. Como por exemplo a morte de Ned; o Casamento Vermelho; Jaime ficando maneta; Tyrion matando a amante e o pai; Dany queimando os escravagistas; Jon sendo morto e depois ressuscitando etc. Por isso, enxergando dessa maneira, tal reviravolta teve seu efeito.
O penúltimo episódio, aliás, é tão impressionante visualmente quanto qualquer filme de guerra (que aqui evoca O Resgate do Soldado Ryan indo Até o Último Homem), com uma fotografia suja, crua e intimista, pelo ponto de vista das vítimas, tirando Daenerys de cena justamente para fortalecer sua inumanidade (e qualquer cena recebe um enquadramento belo e poderoso, como o encontro dos Clegane na escadaria, o cavalo branco em meio às cinzas, a cidade em chamas etc). Mas uma incrível fotografia não salva um roteiro perdido.
Fanservice
Por isso, desde que David Benioff e D.B. Weiss decidiram que não mais impressionariam o público e sim entregariam justamente o que eles queriam, realizando um fanservice que foi a estaca no peito da série (como a ideia ridícula de um “dragão zumbi”, já sugerida por alguém em um fã-pôster um ano antes disso acontecer, entre várias outras), muita coisa soa gratuita e sem sentido.
![Bran, Arya e Sansa em Game of Thrones](https://vitaminanerd.com.br/wp-content/uploads/2019/05/Game-of-thrones02.jpg)
Qual a lógica de Cão e Montanha brigarem no meio de uma destruição? Mesmo que fosse intencionada a tragédia, qualquer lógica aponta para as pessoas quererem salvar a própria vida. Ou do dragão sendo morto pelos piratas de um jeito completamente inacreditável? Afinal, como daquela altura eles não viram os barcos inimigos chegando? E por que Dany não aplicou de maneira eficiente e cruel o fogo sobre os mortos-vivos no terceiro episódio, da mesma maneira que fez depois em Porto Real?
E Euron (que deveria ter morrido junto dos outros) encontrar Jaime exatamente naquela bacia, só para ter uma luta totalmente desnecessária. E para que serviu a Companhia Dourada e a frota de Euron? Para nada, assim como foi com Dorne e vários outros núcleos nas temporadas anteriores. Showrunners completamente perdidos e desesperados querendo enxugar elenco, mas fazendo isso de maneira completamente pobre.
Pontos positivos
Por outro lado, aliado a parte gráfica, a última temporada acertou ao quebrar todas as expectativas, colocando Arya como a assassina do Rei da Noite (que nos livros nem existe e é só uma metáfora para o inverno, que nunca chegou na série, ficando apenas no norte, onde sempre foi frio), Theon e Sor Jorah com finais dignos, uma conclusão coerente para Varys e Melisandre, ainda que Cersei e Jaime tenham encontrado um fim ordinário (teria sido muito mais irônico e poético que o irmão tivesse dado fim a ela, mas isso não é um exercício de probabilidades).
![Daenerys após a conquista da capital](https://vitaminanerd.com.br/wp-content/uploads/2019/05/Game-of-thrones03.jpg)
Por isso, com tantos tropeços e poucos acertos, o último episódio optou pelo caminho seguro, colocando o improvável Bran como governante dos sete reinos, uma figura branda, sábia e mística, que pode determinar talvez uma nova dinâmica de reinado, enquanto os diretores brincam com a nostalgia, ao formar um novo Conselho (o que de fato gera boas saudades e diverte num curto momento, dando até vontade de ver em como seria um mundo administrado por Bronn, Brienne, Davos e Sam, com Tyrion no lugar de sempre).
A Jon e Daenerys, o acerto da série foi em romper qualquer solução clichê de herói ou heroína para ambos, relegando o isolamento para um e a morte para outra, sem deixar jamais de gerar rimas visuais (as asas de dragão, o retorno a neve e aos selvagens), enquanto coloca Sansa em seu lugar de direito e permite que Arya siga seu rumo independente, como lhe é de essência.
Portanto…
Dessa maneira, GoT não desaponta com as soluções, mas também não engrandece nada, e entre vários escorregões (e eu não citei nem a metade) e algumas conquistas, termina de maneira meio amarga meio agridoce, de um jeito morno, mais seguro, mas fazendo menos feio que LOST e Dexter, as comparações inevitáveis de grandes séries com finais desapontadores.
Assim, eu volto a repetir: passando suas emoções com Game of Thrones, se não leu, vá ler os livros. Ali reside a verdadeira experiência, que ainda não acabou. E quando chegar ao fim, seja daqui uma década ou mais, vai ser arrebatadora. Afinal, o maior vilão da série, sempre foi o roteirismo.