Hebe: A Estrela do Brasil, cinebiografia da apresentadora

Hebe Camargo (Andréa Beltrão), famosa apresentadora de TV, tem um programa ao vivo na Bandeirantes, onde aborda os assuntos que acha importante e convida quem deseja. No entanto, após cair nas vistas da censura, Hebe passa a ser vetada pelo diretor do programa e resolve tomar as rédeas de sua própria carreira.

Ao mesmo tempo, ela tem que lidar com o ciúme do marido Lélio (Marco Ricca) e com a solidão do filho Marcello (Caio Horowicz). Hebe: A Estrela do Brasil é a cinebiografia da apresentadora Hebe Camargo.

Hebe, uma mulher com um microfone

A primeira cena de Hebe: A Estrela do Brasil já deixa claro o que o filme quer mostrar. A acompanhamos apresentando um programa na Bandeirantes, onde ela fala o que quer e sobre qualquer assunto que desejar. Não demora muito para que a censura a note e exija que seu programa, que até então era filmado ao vivo, passe a ser controlado. Essa não é uma decisão que agrada a apresentadora.

Inegavelmente Hebe tinha um grande apelo com o público. Também é possível dizer que ela defendeu alguns pontos de vista que eram tabus na época, e automaticamente os apresentou a população. O filme bate muito nessa tecla e mostra Hebe defendendo os direitos LGBTQ+ (mesmo que essa sigla nem existisse na época), trazendo drag queens e mulheres transgênero ao seu programa. Assim, ela dá voz às mulheres, sejam suas convidadas, ou ela mesma.

A trama mostra uma mulher que se recusava a se calar e que falava o que pensava, mesmo que isso pudesse não agradar na época ou posteriormente (como no caso do apoio à candidatura de Paulo Maluf), e que justamente por isso, era dona de um poder inimaginável.

A vida pública e a privada

O longa também quer falar sobre a vida particular da apresentadora, uma vez que a sua vida pública é de conhecimento geral de boa parte da população. Para isso, nos coloca completamente dentro da casa de Hebe e também de sua vida.

É dessa maneira que conhecemos o lado extremamente possessivo e agressivo de seu marido Lélio, que sente ciúmes das interações da esposa com Roberto Carlos (Felipe Rocha) e Chacrinha (Otávio Augusto), mesmo que seja no palco; e a solidão do seu filho Marcello, que se sente abandonado pela mãe e pelo pai (Gabriel Braga Nunes), incompreendido pelo padrasto e que acaba criando sua própria família com os empregados da casa.

O diretor Maurício Farias leva a perspectiva de mostrar outra versão de Hebe até para a fotografia. Muitas das cenas em que a apresentadora aparece são filmadas com ela de costas ou de lado, em oposição ao programa, onde Hebe está sempre de frente, falando com as câmeras.

Aspectos técnicos de Hebe: A Estrela do Brasil

O filme surge na onda das cinebiografias de personalidades brasileiras, como Simonal e Minha Fama de Mau, mas é um pouco diferente de outros filmes recentes do gênero. Este não tem intenção de retratar a vida inteira da apresentadora, o que seria se não impossível, extremamente trabalhoso, já que Hebe viveu 83 anos de uma vida bem movimentada e cheia de marcos, e essa é uma escolha acertada do diretor.

O longa se foca em um período dos anos 80, em que Hebe luta contra a censura. O período abordado também parece certo. Embora se passe nos anos 80, soa atual em vista dos assuntos que aborda: censura, preconceito, machismo e homofobia. Uma parcela das pessoas atualmente pode não ter conhecido ou não se lembrar direito de Hebe, mas não vai sair do filme sem entender as ações da apresentadora.

Por fim, a ideia de mostrar um lado de Hebe que a maioria das pessoas não conhece também é ótima. O público é colocado dentro da sua vida e conhece sua rotina, seja dentro de casa, seja nos bastidores do programa, ou no salão de beleza. Para isso, o diretor usa os dois momentos mais importantes de Hebe como contraponto. Ou seja, se a vemos na TV, alegre e saltitante, em casa acompanhamos os problemas da apresentadora com Lélio. Para combinar com isso, Faria filma Hebe de costas e de lado, em contraste às câmeras de seus programas que sempre a viram de frente.

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Em relação a caracterização, o filme é muito cuidadoso. Traz de volta muitos dos figurinos e das joias da própria Hebe, cedidos por Claudio Pessutti, (interpretado no filme por Danton Mello), sobrinho da apresentadora. Acrescenta também algumas coisas que ressoam o estilo da apresentadora, mas com sua própria identidade. A caracterização em um filme como Hebe: A Estrela do Brasil é extremamente importante, uma vez que ele retrata situações reais e que nem todos os atores escolhidos se parecem fisicamente com as pessoas que eles representam.

Andréa Beltrão

O filme também nos apresenta diversos personagens do universo brasileiro, como Roberto Carlos, Chacrinha, Dercy Goncalves (Stella Miranda), Roberta Close (Renata Bastos) e Silvio Santos (Daniel Boaventura); além das amigas de Hebe, Nair Belo (Claudia Missura) e Lolita Rodrigues (Karine Teles), que se saem bem nos seus personagens. Mas é natural que o grande destaque seja de Andréa Beltrão, que interpreta Hebe.

Beltrão não é especialmente parecida com Hebe, mas está bem caracterizada, com o cabelo loiro já clássico da apresentadora e suas roupas e joias extravagantes. A própria atriz diz que, uma vez que ela não é tão parecida fisicamente com a apresentadora, ela se sentiu livre para sair do viés da imitação e criar a sua própria interpretação de Hebe.

Ela está, de fato, muito bem no filme, para além das caracterizações físicas que ajudam na composição. A atriz foge das caricaturas que seriam um caminho fácil e entrega uma Hebe com o mesmo tino para a comédia, os mesmos trejeitos e quase o mesmo tom de voz. Sem dúvida, um excelente trabalho.

Já leu a resenha sobre o filme Simonal?

Hebe: A Estrela do Brasil não tem pretensões de ser uma cinebiografia que retrata a personalidade em questão do começo ao fim da vida. Isso pode desagradar os espectadores que vão ao cinema à espera de uma aula sobre a apresentadora mas, por outro lado, talvez falar tanto assim sobre uma mulher tão conhecida fosse chover no molhado. O longa, no entanto, funciona por nos mostrar um relance da personalidade de Hebe, tanto a que conhecemos na televisão, quanto a que nos era completamente desconhecida.

Com uma atuação espetacular de Andréa Beltrão e uma trama atual, Hebe: A Estrela do Brasil é um retrato certeiro da apresentadora, que diverte e emociona.

O filme entra em cartaz no dia 26 de setembro.