Legion, a série

David Lynch ficaria orgulhoso. Noah Hawley pegou um personagem de quadrinhos do terceiro escalão da Marvel e em vez de criar mais uma série de super-heróis (que estão em voga), ele concebeu um grandioso fluxo de consciência repartido em 8 episódios, extremamente sofisticado, com uma fotografia exuberante, direções inspiradas, elenco vestindo a camisa dentro da loucura toda e tomadas marcantes, em um produto singular, diferenciado e para poucos.

Veja bem, quando me refiro que Legion é “para poucos”, é exatamente o que quero dizer. Se você sobreviver ao primeiro episódio, estará fisgado para o restante da temporada, que é um grande tratado da psicologia, lidando com palácios da memória, bipolaridade e outros transtornos da psiquê humana — usando os enormes poderes telepáticos de David Haller como desculpa para esse acabamento, e até como pano de fundo.

Sim, temos ótimas cenas de ação e até alguns “momentos mutantes”, com poderes absurdamente estranhos em campo, com sequências que, de tão realistas, causam mal-estar e uma sensação de deslocamento.

Apesar do humor negro, de todo o drama envolvido, do romance bonitinho (que por vezes me lembrou Pushing Daisies), a série mesmo é uma ótima história de terror psicológico e os momentos com o Menino Bravo, ou pior, o Demônio de Olhos Amarelos, se mostram honestamente pavorosos.

De ritmo lento, por vezes bastante arrastado, Legion não tem pressa em desenvolver sua narrativa e seus personagens e você vai compreendendo cada figura e cada momento dentro do seu tempo devido. Nenhuma tomada é gratuita, nenhuma escolha é aleatória e tudo na trama tem uma função que se cumpre no roteiro requintado e rebuscado, sempre com saídas improváveis.

Sendo uma série de super-heróis diferente de tudo o que você já viu e ousada ao extremo, me pergunto como Legion conquistou a FX e a audiência a ponto de ganhar uma segunda temporada. Mas se você está acostumado com Flash, Arrow e The Gifted (e nada de errado com isso), cuidado, Legion vai para outros caminhos e mesmo estes são incomuns, inclusive dentro do mainstream.

Se você for habituado a Lynch, então Legion é para você. Eu mesmo me vi lutando várias vezes para não largar a série, pelo seu ritmo complicado, mas cada minuto valeu a pena e a temporada se mostrou valiosa, uma experiência única, que vale o risco. E sim, é acima da média. Mas insisto, é para poucos.

★★★★