Mindhunter

Boa parte desse sucesso de crítica e público, se deve ao elenco formidável, a começar pelo desconhecido Jonathan Groff (como Holden Ford, baseado na figura real de John E. Douglas, que escreveu os relatos do livro, adaptados aqui para a telinha), que entrega uma atuação contida (e perturbadoramente explosiva nos minutos finais), de um agente do FBI centrado e inteligente, meio autista a sua maneira de enxergar as pesquisas que realiza e que vai ganhando um crescente de ironia e cinismo conforme avança em sua nova e conquistada atuação. Do outro lado da balança, temos o melhor personagem da série na figura de Bill Tench, interpretado da maneira mais mundana e grosseira possível pelo excelente Holt McCallany. Também quero citar minha antiga paixão, Anna Torv, aqui no melhor papel de sua carreira como Wendy; e a nova paixão na figura de Hannah Gross, como a indecifrável (e ao mesmo tempo simplista) Debbie, entre outros, incluindo os atores que praticamente emulam de maneira muito próxima os criminosos da vida real (mas Cameron Britton como Ed Kemper impressiona um nível a mais).

Outra parte do sucesso imediato dessa série, é o trabalho de roteiro e direção (que começa e termina com Fincher, mas que segue em boas mãos por outros diretores no miolo). Voltando a David Ficher, dentre várias obras-primas que o cara concebeu, Zodíaco está no topo — e é exatamente o mesmíssimo tom que ele recupera nesta série, abandonando a ação hollywoodiana (que não teria função alguma na proposta dessa trama investigativa e de pesquisa e de bate-papo com diálogos memoráveis), focando nos arcos dramáticos com o espaço que os 10 episódios lhe fornecem, onde o desenvolvimento dos personagens é o ponto central. Desde a vida em família turbulenta de Bill, até o relacionamento questionável de Holden, passando pela solidão bem resolvida de Wendy (e o que melhor do que metaforizar isso com o uso de um gato, não?).

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Meticuloso ao ponto da obsessão, Fincher tem uma razão narrativa para cada enquadramento e cada movimento de câmera. Mesmo no cinema, o diretor tem feito isso, mas aqui ele pode se espalhar, e transformar em ação – tensa, envolvente, sustentada – uma cena de dois sujeitos sentados a uma mesa, conversando, pelo tempo que for necessário. Sempre usando da sua paleta de não-cores (beges, cinzas, azuis e amarelos aguados e impessoais), da luz econômica, dos grafismos ousados e dos cenários construídos sem adorno, só para indicar que tipo de pessoa os frequenta, Fincher honra a inteligência do seu público e entrega aqui um dos seus melhores trabalhos. O primo mais novo de Zodíaco.

Por fim, o sucesso de Mindhunter se sustenta pelo seu público variado (e não de nicho), em uma mórbida e costumeira curiosidade pela mente singular de um sociopata, de um serial-killer e da maneira como enxergam o mundo e praticam seus crimes. Não a toa, Datena até hoje dá audiência. Mais do que sangue e tragédia, as pessoas querem enxergar além da Matrix e se aprofundar na psique do monstro. Tal qual Holden faz. Mas depois que se entra nisso, você nunca mais volta o mesmo.

 

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