Quem Você Pensa que Sou – Minha webnamorada…

... é webdemais!

Quem Você Pensa Que Sou traz a história de Claire Millaud (Juliette Binoche), uma mulher de 50 anos desconfiada de seu marido que decide criar um perfil falso em uma rede social. Lá, ela atende por Clara, uma bela jovem de 24 anos. Alex, amigo do seu marido, é uma das pessoas com a qual o avatar interage. O homem acaba se apaixonando por Clara, enquanto Claire, por trás das telas, também nutre um sentimento de amor por Alex. Apesar de tudo se desenrolar no mundo virtual, as emoções evocadas são bastante reais, e podem trazer complicações.

Lá no alvorecer da internet, quando a gente só ficava online depois da meia-noite e passava a madrugada praguejando impropérios contra conexões de 56Kbps, era muito fácil se passar por outra pessoa. Nas salas de bate-papo do UOL, enquanto discutia futilidades com completos desconhecidos, por vezes o internauta mais incauto, virgem e com o pau na testa chamava a JaqueNinfetinha19 para papos mais calientes no chat privado.

No fundo, todo mundo sabia que a JaqueNinfetinha19 era na verdade um programador gordo de 38 anos chamado Gonçalves que ainda morava com a mãe. Mesmo assim, por falta de emoção de verdade, numa época em que tudo era mais simples, a gente se iludia e ficava xavecando o Seu Gonçalves, mandando por e-mail cartões virtuais do charges.com cheios de corações e paródias toscas.

Quem você pensa que sou

E o que isso tem a ver com o filme, cara?

O filme francês Celle que vous croyez, que chega no Brasil com o título levemente acusatório “Quem você pensa que eu sou” conta uma história parecida, mas do ponto de vista do Seu Gonçalves. Porém, ao invés de um homem com problemas sociais que perdeu na vida, Seu Gonçalves é uma professora de 50 anos, um tanto quanto bonita e atraente (uma “cougar“, como o próprio filme diz – se você não sabe o que é, procure no Xvideos), divorciada, com dois filhos.

Vivendo numa Paris que não precisa mostrar a Torre Eiffel, mas onde é eternamente outono (talvez seja uma alegoria com a idade da personagem, ou talvez ele tenha sido completamente gravado em duas semanas), Claire Millaud inventa uma web-persona pelo Facebook – apropriadamente chamada Clara – para poder web-stalkear um antigo rolo em paz. Ela começa a se web-corresponder com um amigão do crush e a web-história vai web-crescendo e perdendo o controle. Ao invés de criar seus web-personagens no Habbo Hotel e fazerem web-sexo, eles trocam telefones. Assim se tornam aqueles casais chatos que passam os últimos 10 minutos de cada ligação dizendo “desliga você primeiro”.

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Somente uma geração que não virou a madrugada em canais do IRC ou não ficou 3 dias baixando Sim City ilegalmente pelo torrent pra no final descobrir que o arquivo era um filme pornô envolvendo travestis e anões, pode cair em um golpe tão manjado quanto a webnamorada que é perfeita demais pra ser verdade. Mesmo assim, dá pra assumir que millenials são burros e aceitar o enredo do filme. Nem que seja para admirar a atuação de Juliette Binoche. Ela está simplesmente espetacular.

Como o filme se baseia fortemente em relações digitais, na maioria das vezes, vemos apenas o lado dela em uma conversa. E a atriz precisa entregar a emoção daquela conversa sozinha. E ela carrega o filme nas costas. É um prazer imenso vê-la atuando, a um ponto que chega a irritar, pois claramente essa mulher não precisaria criar uma persona fake para ser encantadora.

Quem você pensa que sou

Mas e aí? Quem você pensa que sou?

O filme teve uma receptividade moderadamente positiva lá fora. Isso significa que daqui uns 5 anos, ele vai ganhar um remake hollywoodiano, provavelmente estrelando Julia Roberts. Com um roteiro mais babaca, mas com uma produção mais caprichada.

Não que a produção do filme seja ruim; porém, particularmente a forma como o diretor Safy Nebbou escolheu para mostrar os personagens lidando com tecnologia é, no mínimo tediosa. Como a troca de mensagens e uso de internet é um ponto crucial do enredo, imaginava uma solução mais engenhosa do que exibir a tela do computador enquanto os atores digitam – talvez fazer algo no estilo da série Sherlock, onde as mensagens e interações tecnológicas são exibidas na tela simultaneamente com a reação dos personagens (o Safy realmente precisa assistir este episódio de “Every frame a painting”).

No final, Quem Você Pensa Que Sou leva de bônus uma estrela pela brilhante atuação de Juliette Binoche, e uma estrela extra para ajudar na relação diplomática entre Brasil e França, que anda meio conturbada. Com essa nota extra, eu tô aqui fazendo minha parte. O filme entra em cartaz dia 12 de setembro.

Quem Você Pensa que Sou

Nome Original: Celle que vous croyez
Direção: Safy Nebbou
Elenco: Juliette Binoche, Nicole Garcia, François Civil, Guillaume Gouix, Charles Berling
Gênero: Drama, Romance
Produtora: Diaphana Films
Distribuidora: California Filmes
Ano de Lançamento: 2019
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