The Dropout
O caso Elizabeth Holmes
Depois de largar a faculdade, Elizabeth Holmes (Amanda Seyfried) funda a Theranos, uma empresa farmacêutica que diz que pode revolucionar a maneira com que se faz exames de sangue.
A empresa de Elizabeth rapidamente ganha patrocinadores e ela fica cada vez mais famosa, passando a ser considerada a bilionária mais jovem do mundo, mas o que ninguém sabe é que a máquina que Elizabeth criou não funciona de verdade e que ela vem dando resultados errados para os clientes.
The Dropout é inspirado em uma história real.
A história real
Elizabeth Holmes, nascida em 1984, ficou famosa mundialmente aos 19 anos, em 2003, depois de fundar a Theranos, uma empresa que prometia mudar a maneira com que se fazia exames de sangue. Segundo Holmes, só era necessária uma gota de sangue, que seria colocada em uma máquina e, assim, seria possível realizar os mais diversos exames. A máquina não só era uma alternativa para pessoas que passam mal quando tiram sangue, como também oferecia exames bem mais baratos do que os laboratórios tradicionais, isso em um país que não tem sistema universal de saúde e onde os gastos com cuidados médicos podem se tornar caríssimos.
A história de Elizabeth por si só, chamava muita atenção. Ela tinha apenas 19 anos e havia largado a faculdade de engenharia química, na Universidade Stanford, e agora se dedicava só à empresa. Ela passou a ser comparada a outros jovens que também ganharam muito dinheiro com a criação de empresas, inicialmente pequenas, como Steve Jobs e Mark Zuckerberg, e muitas pessoas achavam que ela era um gênio.
Mas em 2015 começaram a surgir boatos de que os exames não eram tão confiáveis assim e que pacientes com HIV, câncer, e que tinham sofrido abortos espontâneos tinham recebido resultados errados. Na realidade, a máquina da Theranos simplesmente não funcionava, e embora Elizabeth dissesse que os testes eram feitos na sua máquina, algumas vezes eles eram feitos da forma tradicional, pela equipe da Theranos, e em outras, através de máquinas de outras empresas. O jornalista John Carreyrou, do Wall Street Journal, publicou uma série de reportagens onde denunciava, com a ajuda de fontes de dentro da Theranos, tudo que acontecia dentro da empresa.
Elizabeth e seu sócio – e também namorado – Sunny Balwani, foram acusados de fraude massiva pela Comissão de Títulos e Câmbio dos Estados Unidos, mas ela só foi considerada culpada em fevereiro de 2022, e condenada a mais de 11 anos de prisão, em novembro.
Elizabeth
The Dropout é narrada majoritariamente do ponto de vista de Elizabeth e começamos a acompanhá-la quando ela ainda é adolescente. A moça é uma jovem determinada, e que se dedica à escola com bastante afinco, mas tem dificuldades em criar e manter laços sociais. Elizabeth admira Steve Jobs e só tem um único sonho na vida: se tornar milionária.
Durante um intercambio em Pequim, para o qual ela passou anos estudando mandarim, Elizabeth conhece Sunny Balwani (Naveen Andrews), um paquistanês com quem ela faz amizade, mas a atração entre os dois é óbvia, ainda que eles não se envolvam romanticamente nessa ocasião e que a diferença de idade entre eles seja gritante. Elizabeth chega a Stanford, mas sua ambição parece superar a lógica e ela tenta vender seu projeto – um chip permanente que permitiria não só a realização de exames, como também a aplicação de antibióticos -, que vários professores dizem não funcionar. Até que ela consegue criar a Theranos, se vendendo como alguém que vai revolucionar a técnica de exames de sangue.
A primeira parte de The Dropout se preocupa em apresentar Elizabeth e destacar as características da personalidade dela que a fizeram chegar aonde chegou e manter a sua mentira por tanto tempo. A plateia então, reconhece na adolescente Elizabeth características que vão moldar a Elizabeth adulta e que de alguma forma tentam explicar a história que vamos assistir ao longo da série.
A Theranos
Já a segunda parte da temporada é focada na empresa de Elizabeth, a Theranos. A startup se faz presente desde o primeiro episódio, já que esse é o grande sonho da protagonista. Elizabeth não consegue apontar como vai ficar milionária, mas ela sabe que quer se tornar milionária. The Dropout segue a Theranos desde o seu princípio, até as descobertas de fraudes.
Quando Elizabeth funda sua startup ela é pequena e não tem investimentos, a “empresária” precisa escolher entre pagar o aluguel da empresa ou de sua própria casa e acaba morando na empresa, dormindo em sua sala, mas claro que com o tempo tudo se torna mais profissional. Elizabeth consegue investidores que acreditam na sua ideia e a Theranos cresce da noite para o dia.
Quando a Theranos já é uma grande empresa e já recebe investimentos de nomes como George Shultz (Sam Waterston), a plateia então tem acesso a outros pontos de vista, e um deles é o de Tyler Shultz (Dylan Minnette), neto de George, que consegue um estágio na Theranos, mas logo descobre que nada é do jeito que Elizabeth vendeu, e Erika Cheung (Camryn Mi-Young Kim), outra estagiária que fica chocada com o tanto de exames errados que a empresa fornece. Tyler e Erika são as primeiras fontes do jornalista John Carreyrou (Ebon Moss-Bachrach).
O telespectador consegue notar algo de estranho em Elizabeth desde o começo, embora em muitos momentos ela só pareça ser uma jovem sonhadora, mas só é possível apontar exatamente o quê com o tempo, conforme Elizabeth vai ficando cada vez mais neurótica e começa a criar mentiras em cima de mentiras para proteger seu império. The Dropout mostra que existem poucas linhas que ela não cruzaria para manter seu status.
Aspectos técnicos de The Dropout
A série é organizada de uma maneira bem interessante, o telespectador começa sendo apresentado a Elizabeth, desde sua adolescência até a sua vida adulta, e acompanhamos cenas que provam que Elizabeth é competitiva e ambiciosa desde muito nova. Depois disso, a Theranos entra em cena e como a emprea é basicamente a vida de Elizabeth, toda a segunda parte da série é voltada a ela. É assim também que descobrimos tudo que está errado ali dentro.
Elizabeth sofre mudanças durante essa jornada e elas são muito relevantes. Nos primeiros episódios vemos uma jovem adulta, com roupas pouco sofisticadas, muita calça jeans, muito moletom e pouca maquiagem. Depois que ela vira CEO, no entanto, Elizabeth passa a se vestir como Steve Jobs: camisa de gola rolê preta e calça preta. O cabelo sempre preso e um batom vermelho nos lábios que viram sua marca registrada. A protagonista também muda o seu tom de voz, deliberadamente começando a falar mais grosso depois que cria a Theranos e sabemos disso porque não só a acompanhamos desde muito nova, mas também porque a vemos treinando a voz.
A mudança não é apenas estética, é uma maneira de mostrar que Elizabeth está cada vez mais próxima de se tornar a mulher que ela sempre sonhou ser, a executiva de sucesso, a milionária mais jovem do mundo, a mulher responsável por revolucionar a indústria farmacêutica, ainda que isso tudo seja em função de uma fraude. E claro que a série reflete uma mudança real na vida da verdadeira Elizabeth, que também se vestia dessa maneira.
Boa parte da qualidade da série se dá devido a atuação de Amanda Seyfried, que é impecável. Seyfried não é especialmente parecida com Holmes, mas está muito bem caracterizada, a atriz não só copia à perfeição as expressões faciais e corporais da biografada, como também consegue mudar sua própria voz, se aproximando demais do tom de Elizabeth. Performances secundárias como as de Naveen Andrews, Stephen Fry e Sam Waterston também se destacam e complementam a de Seyfried.
The Dropout consegue manter o suspense e a dúvida do que vai acontecer no próximo episódio e, por isso, é quase impossível largar a série antes do final. Isso combinado com a trama interessantíssima e real, fazem da série uma atração irresistível. É fato inegável que a produção consegue trabalhar a história real de Elizabeth Holmes de maneira muito competente.
A história de Elizabeth Holmes já parece saída de uma ficção, The Dropout organiza essa trama, saindo da jovem ambiciosa para a mulher disposta a tudo pelo poder, para que o telespectador consiga perceber como Elizabeth se tornou a golpista que estampou as manchetes de jornal.