Uma Aventura Lego, uma comédia brilhante
A imaginação e a criatividade como formas de resistência
Responsáveis por reinventarem as animações contemporâneas com novas técnicas, estilos e narrativas, a dupla Chris Miller e Phil Lord concebeu uma obra-prima moderna em “Homem-Aranha no Aranhaverso”, mas muitos anos antes começaram a colocar as peças certas com o tão inventivo e divertido quanto, Uma Aventura Lego, que usa de elementos básicos para compor um longa animado praticamente brilhante!
Eles emprestam os símbolos da Jornada do Herói sem dó nem piedade e brincam com essa estrutura. Assim, os diretores e roteiristas (juntamente também dos autores Dan Haheman e Kevin Hageman) pegam um zé ninguém para torná-lo especial em uma aventura onde ele é um tipo de escolhido (“o Especial”). Ele precisa salvar o universo de um vilão que quer tudo do jeito dele. Este conquistou o mundo construindo muros para todos os cantos, antecipando um inimigo real, na figura de Trump, impelindo que a humanidade siga regras pré-estabelecidas.
Fazendo uma baita crítica social sobre consumismo, o roteiro (que é sagaz do começo ao fim) também apresenta um protagonista maria-vai-com-as-outras, representando perfeitamente o público atual (inclusive o da web), que só replica músicas mequetrefes e gostos duvidosos, tudo em prol de aceitação em uma panela, tornando-o assim apenas mais uma marionete.
Uma Aventura Lego
Absurdamente engraçado, a animação também pode ser considerada uma das maiores comédias já produzidas nos últimos anos. Afinal, basicamente todas as piadas inseridas nos diálogos dos personagens funcionam e fazem rir. São pequenas tiradas certeiras que cabem tanto na versão em idioma original, quanto dublada, evidenciando a alta qualidade da Delart também na adaptação.
A história, no entanto, é claramente voltada para o público juvenil e principalmente adulto. Muitas das gags e comentários são referentes a cultura pop de outros períodos, a situação política global, e até mesmo contextos que um pequeno não conseguiria absorver. Por outro lado, as crianças vão se encantar com o visual impecável do CGi, que emula com perfeição um brinquedo LEGO, a ponto de não parecer computação gráfica e sim as próprias pecinhas se movendo alucinadamente.
Boas sacadas
O enredo, que a todo momento subverte algum ponto da narrativa, faz bom uso de seus estereótipos (do mago à mocinha, do vilão ao subchefe, do protagonista improvável aos alívios cômicos, entre outros tantos). Entretanto, as imposições da Warner sobre suas principais propriedades dão uma canseira aqui e ali. Tem Batman demais e as piadinhas com a Liga da Justiça desgastam até certo ponto. Porém, novas propriedades da concorrência (como Star Wars, por exemplo), são adesões bem-vindas.
E mesmo esses escorregões são menores e compensados por uma aventura inventiva, com um desfecho completamente inusitado, que ainda traz o live-action muito bem atrelado ao contexto todo, fortalecendo o imaginário infantil suplantando a seriedade mecânica e sistemática do mundo adulto, algo que supera inclusive os discursos de Toy Story, sendo um avanço nesse sentido.
Colorido, engraçadíssimo e muito bem sacado, Uma Aventura Lego é um atestado sobre criatividade, imaginação e ousadia quando o assunto é animação, saindo do lugar-comum para fornecer uma obra singular. Onde todos somos resistência.