A Caçada – Esquerda versus Direita
Em uma batalha sangrenta, irônica e afiada no humor negro
Doze estranhos acordam sem saber onde estão. À sombra de uma macabra teoria da conspiração, um grupo se reúne em um local remoto para caçá-los por esporte. A Blumhouse colocou o diretor Craig Zobel à frente do polêmico projeto de A Caçada, que metaforiza as polarizações políticas dos EUA (mas que pode encontrar paralelos no Brasil), condenando liberais e conservadores de igual maneira.
O filme foi cancelado nos EUA em agosto de 2019 após dois tiroteios deixarem 31 mortos em duas cidades norte-americanas, no mesmo dia. A produção – que na época foi criticada até mesmo por Donald Trump – ganhou uma segunda chance em lançamentos digitais durante a pandemia. O filme se propõe não exatamente a uma crítica aos lados extremos (que por aqui fica rasa), mas a uma sátira política exagerada e ultraviolenta – onde obtém sucesso – e o humor negro, cínico e irônico da história funciona do começo ao fim, assim como os pequenos mistérios que vão sendo revelados à medida que a obra avança.
No elenco vasto, vemos inúmeras representações estereotipadas da esquerda e da direita daquela nação, mas Hilary Swank se diverte muito. Betty Gilpin, que eu nunca tinha ouvido falar, é mais do que competente para assumir o protagonismo depois que outras figuras vão caindo; suas caras e bocas são ótimas e não consigo deixar de pensar, após a sessão… será que ela era de centro?
A Caçada
Com roteiro de Nick Cuse e do famoso Damon Lidelof (”Lost”, ”The Leftovers”, ”Watchmen”), A Caçada faz muito barulho para pouca controvérsia e mesmo acertando no marketing para atrair os lados da moeda, o longa é menos polêmico do que gostaria. Zobel mistura ”Bacurau” com ”Kill Bill” (incluindo até a cena de duas mulheres brigando na cozinha) para realizar uma divertidíssima trama de perseguição e sobrevivência, com mortes cruéis e absurdas à maneira dos slashers teens, como ”Premonição” e ”Pânico”.
Mesmo com o pano de fundo político e polarizado, sem classificar “certos” e “errados”, o diretor foca na ação de alguns personagens e nas ideias criativas em como morrer (ou matar), em uma exibição curta e grossa, que pega o espectador de assalto e o arrebata sem perguntar de qual lado veio.
Curiosamente, quem vai à caça são os liberais de elite, uma turma que costuma exigir mais regulamentação de armas no país. E os caçados são os “deploráveis”, apelido que Hillary Clinton deu aos fãs de Trump e que uma das protagonistas do filme usa ao comentar o jogo com seus amigos (um dos “deploráveis” é um dono de podcast que espalha fake news). Não é necessário compreender completamente a política norte-americana para fazer bom aproveitamento desse filme, mas um mínimo de conhecimento pode reforçar as piadinhas espalhadas pelo roteiro afiado.
De qualquer maneira, entre matanças, provocações e acusações, quem vence no final por aqui é a hipocrisia.
https://www.youtube.com/watch?v=49ZRVcu-V08&ab_channel=PortalClique