A Sombra do Pai, novo terror de Gabriela Amaral Almeida

A Sombra do Pai é o segundo longa metragem de Gabriela Amaral Almeida, que também dirigiu O Animal Cordial. O filme conta a história de Dalva (Nina Medeiros), uma menina de nove anos que vive com seu pai, Jorge (Júlio Machado) e sua tia, Cristina (Luciana Paes). A família ainda lida com a morte da mãe de Dalva.

Quando Cristina se casa e sai de casa, Dalva se torna responsável por ela mesma e por seu pai. Ela tem que começar a viver como adulta, enquanto Jorge tem que aprender a lidar com a falta que a esposa lhe faz. Enquanto isso, Dalva flerta com o ocultismo e o sobrenatural.

O luto

A Sombra do Pai permeia o luto da família de Dalva. A mãe de Dalva morreu há dois anos, mas fica claro que a menina ainda sente muita falta da mãe. Em diversos momentos, ela pede para que a mãe volte. Mas não é só Dalva que sente falta da mãe, Jorge também parece não saber o que fazer depois da perda da esposa. Quando sua irmã o ajuda em casa, ele ainda consegue manter o controle da situação, mas quando Cristina vai embora, ele se vê sem rumo.

O ator Júlio Machado, que interpreta Jorge, enquanto se preparava para o papel quis investigar essa ideia de paternidade onde o homem se torna responsável apenas por prover o sustento da família, enquanto o trabalho de casa e a criação dos filhos fica a cargo da mulher, como se o pai não devesse ter laços afetivos com seus filhos e somente sustentá-los.

Nem Dalva, nem Jorge conseguiram chorar a morte da mãe. Nenhum dos dois superou o luto porque não teve sequer tempo de fazer isso. Uma pessoa que precisa trabalhar para mal sustentar sua família, como é o caso de Jorge, não tem tempo de sentir nada. Seja o luto pela esposa, seja o amor pela filha.

A sombra da mãe

Embora o titulo do filme seja A Sombra do Pai, o que mais fica na mente do espectador é a presença/ausência da mãe. Dalva chama constantemente por ela, pois se sente solitária. E com a partida da tia, ela se torna automaticamente responsável pela casa e por isso, precisa virar uma adulta.

Dalva perde primeiro sua mãe, e depois a sua tia, que é sua segunda figura materna. Quando ela vai embora, diz para a menina que agora ela é “a mulher da casa” e que ela deve cuidar do pai, apesar de Dalva ter apenas nove anos, e de sabermos que o lógico seria que Jorge cuidasse da filha. No entanto, Jorge parece completamente incapaz de cuidar da sua própria vida, que dirá da menina e da casa que os dois dividem. É nesses momentos que fica evidente a falta que a mãe faz.

Naturalmente, qualquer pessoa que perca a mãe vai sentir falta dela. Mas a sensação é um pouco maior quando se é criança, porque uma criança é, na teoria, muito mais dependente da mãe do que um adulto. Dalva precisa se tornar a adulta da casa, já que não tem mais a mãe ou a tia e que o pai não se comporta como um adulto.

O filme também faz uma análise sobre a duração da vida de nossos pais e do quanto dependemos deles. Uma pessoa adulta é sempre uma criança quando tem os pais por perto. Não é à toa que diversas pessoas que se tornam órfãs, mesmo depois da infância, comentam que só se sentiram adultas de fato quando se viram frente a frente com a morte iminente de seus pais.

Aspectos técnicos de A Sombra do Pai

A Sombra do Pai já chama atenção por ser um filme de terror, um gênero que não é comum no cinema brasileiro e que é considerado, no mundo inteiro, um gênero “menor”. A diretora Gabriela Amaral Almeida comenta que seu interesse em filmes de terror está relacionado à ideia de contar histórias e comentar o mundo usando o terror para isso.

A Sombra do Pai certamente o faz. O filme fala sobre aspectos sociais, sobre machismo, sobre paternidade e sobre a relação entre pais e filhos. Claro que a tudo isso se soma a aspectos sobrenaturais, deixando o filme ainda mais interessante.

Como todo bom filme de terror, a fotografia é mais puxada para tons escuros, o que dá um clima lúgubre que funciona. A produção também usa de elementos do mundo infantil, como bonecas e cavalinhos de balanço fora de seu contexto, o que torna o filme ainda mais assustador. A primeira cena do filme é justamente Dalva desenterrando uma boneca, mas a princípio pensamos que estão desenterrando uma criança.

Um terror um tanto diferente

O filme também não se apoia em sustos óbvios e jump scares. Assim, é justo dizer que ele se foca mais na trama e nos seus personagens, se tornando, dessa maneira, um terror psicológico. O filme também é repleto de referências a outros filmes de terror que vão agradar aos fãs do gênero. Aparecem cenas de O Cemitério Maldito e A Noite dos Mortos Vivos e a alusão ao clássico de Stephen King é bem clara na trama do filme.

O elenco também é ótimo. Luciana Paes está completamente dentro de sua personagem, assim como Júlio Machado que conseguiu colocar na tela diversos aspectos do homem contemporâneo. Mesmo que não fique claro em que época o filme se passa. Já Nina Medeiros, que interpreta Dalva, de fato rouba a cena. Ela está perfeita no papel e como é a protagonista, tem mais cenas que os outros atores. Luciana ganhou o prêmio de Melhor Atriz Coadjuvante no Festival de Brasília e o filme levou também os prêmios de Melhor Som e Melhor Montagem.

Outro ponto positivo de A Sombra do Pai é que ele consegue trazer o universo do terror, que geralmente está ligado ao cinema norte americano, para o Brasil. Isso é muito interessante e acrescenta ainda mais ao gênero do terror nacional.

A Sombra do Pai é um terror nacional que fala sobre temas com os quais é possível se relacionar. O filme consegue deixar o público com os olhos grudados na tela. O longa entra em cartaz no dia 2 de maio.