Destacamento Blood, de Spike Lee
Uma divertida, estilosa e brutal caça ao tesouro
Spike Lee reforça seu discurso sobre “vidas negras importam” (especialmente em seu contexto norte-americano), fazendo uma mistura deliciosa e improvável de ”Indiana Jones” com ”Apocalipse Now” em Destacamento Blood, um filme enervante, aventuresco e imprevisível, repleto de bons resultados.
O longa conta a história de um grupo de veteranos da Guerra do Vietnã que retorna ao país nos dias de hoje, em busca dos restos mortais do seu comandante e de um tesouro que enterraram enquanto serviam lá. Lee consegue sustentar muito bem seu humor ácido e mordaz, com momentos dramáticos impressionantes, além de cenas de violência realista – isso quando ele não expõe uma foto chocante jogada na tela repentinamente –, tudo embalado por uma trilha pontual e certeira, e uma edição estilosa, que remete muito a Tarantino, como já visto em sua obra anterior, o excelente ”Infiltrado na Klan”.
Destacamento Blood
Destaco aqui os cortes entre ângulos, que repetem o gesto do segundo anterior, que podem parecer um erro de continuísmo num primeiro momento, na verdade são um reforço de ação que a trama quer passar; e também as pontuais viagens ao passado, quando a tela fica quadrada e granulada; no mais, também vale ressaltar a criativa escolha de manter os atores idosos no flashback (só com um deles jovem, justamente o falecido), para valorizar suas interpretações.
E mesmo com algumas batidas previsíveis (durante o segundo ato, me peguei esperando a primeira pessoa explodir por uma mina terrestre, mesmo que isso não tenha acontecido antes, apenas porque um arenque vermelho foi deixado no início e a estrutura me levou a cogitar essa possibilidade), o diretor soube brincar com a expectativa de seu público, pegando de surpresa de qualquer maneira.
O elenco
O elenco é muitíssimo bem dirigido por aqui, a começar por Delroy Lindo, que brilha praticamente sozinho do começo ao fim, em uma atuação forte, alucinante e repleta de variadas emoções. Clarke Peters equilibra o jogo de um lado, com um personagem sensato e reflexivo, enquanto Jonathan Majors consegue ser o novato que realmente parece perdido no meio daquele rolê.
Jean Reno, Johnny Tri Nguyen, Isiah Whitlock Jr., Norm Lewis, Mélanie Thierry e Lê Y Lan interpretam figuras mais tipificadas, que funcionam de maneira certeira em suas posições. Chadwick Boseman faz uma ponta de respeito, que não deixa de soar mórbida na sessão, dada a condição de seu general morto (o filme foi lançado antes do falecimento do ator, mas é impressionante como isso e outras mensagens, ressoam até os dias de hoje). E pensar que o cineasta queria Denzel Washington, Samuel L. Jackson e Giancarlo Esposito no elenco, que se mostrou impressionante mesmo sem esses grandes nomes.
Sabendo dosar aventura pulp com crítica social e recorte histórico, Spike Lee realiza um dos seus melhores e mais relevantes filmes, que merece ser visto e revisto ao longo dos próximos anos. E continuará fazendo muito sentido.