Deus tem AIDS
Documentário necessário
O documentário Deus tem AIDS retrata o cenário depois de 40 anos da pandemia de AIDS no Brasil, tentando desmitificar a síndrome e o preconceito, várias vezes, através da arte.
Entrevistando sete artistas e um médico ativista, o filme é informativo e acompanha as trajetórias individuais de pessoas vivendo e convivendo com o vírus.
O vírus nos dias de hoje
Uma das propostas de Deus tem AIDS é falar sobre o vírus nos dias de hoje, para tal, o documentário entrevista pessoas que vivem com HIV e elas relatam suas experiências pessoais e trajetórias de vida com a síndrome. Uma das entrevistadas, por exemplo, nasceu com HIV porque sua mãe tinha, e em outros casos, o entrevistado contraiu o vírus através de relações sexuais.
O roteiro se pergunta por que o estigma e até o conhecimento em relação a síndrome não se alteraram significativamente desde os anos 1980, quando aconteceu a epidemia, e com isso, o preconceito também continua.
Outra questão que vem à tona é que a AIDS ainda é, erroneamente, ligada a homens cisgêneros, homossexuais, então, para as pessoas que fazem parte de minorias, é primeiramente muito difícil de “sair do armário” – o ato de contar para as pessoas que se vive com HIV -, e em segundo lugar, os tratamentos e as políticas públicas também são voltadas para os homens cis.
Política também é um assunto do documentário, já que é de conhecimento geral que sempre existiu pouca boa vontade para combater a HIV e tratar a síndrome depois que ela já foi contraída, mas Deus tem AIDS fala especificamente sobre o governo Bolsonaro, que demitiu especialistas do ministério da saúde, tirou as informações sobre HIV das redes sociais oficiais e produziu propagandas que incentivavam a abstinência sexual, o presidente chegou a dizer que uma pessoa com HIV é “uma despesa para todos no Brasil”.
A arte como forma entendimento
Mas o grande diferencial aqui é a maneira com a qual o filme aborda a questão do HIV através da arte. Sete dos oito entrevistados do documentário são artistas que usam suas performances e obras para falar sobre a síndrome, seja sobre suas vidas e sobre suas questões pessoais, seja como forma de ensinar outras pessoas e diminuir o preconceito.
O documentário se preocupa em mostrar a obra artística de cada um deles, e assistimos a uma variedade bem grande de tipos, estilos e matérias. Algumas sutis, outras bem incômodas, mas todas com a intenção de passar uma mensagem.
Os próprios entrevistados citam que não existem muitos artistas com HIV fora do armário, então, é difícil até pensar em uma arte voltada e produzida por esse nicho, as obras que falam sobre o assunto, falam muito pouco com os dias de hoje, e parecem paradas no tempo, retratando, com frequência, a epidemia e os primeiros casos. Ainda que o filme se passe nos dias de hoje, a abordagem ainda é muito antiga, por isso, é interessante que um documentário tenha a intenção de falar sobre obras de arte atuais que tratam do tema.
Aspectos técnicos de Deus tem AIDS
Deus Tem AIDS é um documentário com aspectos bem tradicionais do gênero, como por exemplo, as entrevistas, mas com alguns elementos que o diferenciam. Embora o filme tenha entrevistas, elas se dão em diversos lugares e não tem aquela cara de documentário clássico. Um dos entrevistados, por exemplo, está deitado em uma rede. A ideia parece ser trazer o tema à tona em uma espécie de conversa informal, como se a plateia também estivesse ali ao lado dele na rede.
Além disso, o filme tem cenas das performances de cada artista, que acrescentam muito ao conteúdo. No entanto, o que mais chama atenção é o tanto de informação que o filme passa, é difícil assistir ao longa e não aprender alguma coisa, o que por si só, já cumpre um dos objetivos da obra.
O filme também foge de conclusões óbvias, não trata nenhum dos entrevistados como coitadinhos ou como vítimas e deixa claro que quem vive com o vírus não está condenado. Os depoimentos são bonitos e emocionantes.
Deus tem AIDS é um documentário extremamente necessário, não só para quem convive com o HIV, mas também para qualquer pessoa, uma vez que ele desmitifica preconceitos e traz muita informação. O filme chega aos cinemas no dia 1 de dezembro.