Espiral – O Legado de Jogos Mortais

A burrice mata

A franquia “Jogos Mortais” ganha mais um capítulo com “Espiral – O Legado de Jogos Mortais” (uma tradução decente para “Spiral – From the Book of Saw”). Com a promessa de ser mais focada em um thriller policial do que em terror barato e com nomes bem conhecidos no elenco (tem até o Samuel L. Jackson), o público geral talvez espere mais do filme do que ele se propõe a entregar.

Espiral – serras, membros e tripas

Lá em 2004, quando o primeiro “Jogos Mortais” foi lançado, ninguém pensava em uma continuação. Ninguém nem acreditava que o filme ia pra frente, já que a distribuidora Lionsgate tinha um pé atrás com ele, cogitava nem lançar. Mas, com um orçamento de pouco mais de um milhão de dólares – o que, se falando de cinema é uma pechincha, não deve nem pagar os lanches dos figurantes de “Vingadores Guerra Infinita“, ela decidiu dar uma chance pra minúscula Twisted Pictures e, bem… o resto é história: o filme faturou US$56 milhões nos EUA e mais de US$100 milhões no resto do mundo, rendeu mais do que bitcoin.

Desde então, ganhou sete continuações, cheias de armadilhas sangrentas e nojentas. A qualidade de roteiro vai sendo jogada ladeira abaixo em troca de cenas de terror trash e investimento em milhões de litros de sangue de mentira. O mundo mudou e se uma piscina de seringas não parece mais uma ideia tão ruim em um país tão sedento por vacinação, então a alternativa talvez seja melhorar a história do filme mesmo.

Talvez por isso os fãs mais dedicados da franquia vão ter a ideia de que Espiral é o melhor filme desde o primeiro: ele troca as cenas angustiantes de pessoas mergulhando a mão em ácido por personagens mais bem trabalhados, com mais de uma camada óbvia e com conflitos internos mais reais.

Espiral
Chris Rock e Max Minghella em cena de Espiral

Os heróis

Eu não sou propriamente um especialista em “Jogos Mortais” (apesar de já ter pulado voluntariamente em um arbusto de espinhos para pegar uma bola de futebol americano), mas a grande mudança deste filme parece ser o foco mantido na equipe de detetives que investigam os crimes ao invés das vítimas tentando escapar de armadilhas.

O protagonista é interpretado por Chris Rock: um detetive nos seus 40 anos de idade, mas com alma de 90, que fala gritando e sai reclamando de tudo – mas em defesa do Chris Rock, a parte de falar gritando é característica dele mesmo. Ele até começa o filme com um monólogo cômico claramente escrito por ele e muito fora de tom de todo o resto do filme. É como se o ator simplesmente não pudesse se conter.

A história embarca naquele esquema de policial novato fazendo dupla com o ranzinza da delegacia. Entretanto, já o agravante que o tal ranzinza é o último policial honesto da cidade. E o filme vai mostrando as investigações, jogando uns flashbacks para explicar as conturbadas relações entre os policiais e não sai muito disso. Eu até fiquei procurando o Denzel Washington, não é possível que não tenham chamado ele.

Espiral
Samuel L. Jackson

Os jogos

Mas é claro que as armadilhas angustiantes estão no filme, apenas não são propriamente o foco da história, o que é algo bom. Elas nem são tão criativas quanto costumavam ser para não perdermos muito tempo nelas, o que pode desagradar os fãs mais sanguinários, mas o público em geral pode ir mais tranquilo, pois são poucas as cenas onde se faz necessário desviar os olhos da tela.

Por conta desses estratagemas menos abusados, a relação com o resto da franquia parece bem mais leve e até desnecessária. Se quisessem cortar uma ou duas cenas do já curto filme de uma hora e meia, a relação seria absolutamente nenhuma e eu estaria aqui apenas praguejando que é parecido demais com jogos mortais, pensando bem foi bom ter explicitado essa conexão.

Espiral

O vilão

Com pouca criatividade nas armadilhas, o maior defeito do filme é mesmo o vilão. Mais precisamente, a forma como o filme tenta passar a ideia de que o vilão é um gênio do mal, tendo cada passo dos planos cuidadosamente planejados e arquitetados.

O problema é que essa premissa é difícil de engolir uma vez que descobrimos que absolutamente todos os personagens são incrivelmente burros. As ações são orientadas por falta de inteligência. Se um assassino serial me oferecer para jogar um jogo, minha resposta provavelmente seria um “não, valeu, eu tenho um grupo de board game pra isso, tem jogo lá que a gente nem jogou ainda, não vou trair meus trutas agora”.

A forma como o filme tenta criar um personagem inteligente é deixando todos os outros imbecis, como se todos ali tivessem saído de um grupo de WhatsApp bolsonarista. Pensando bem, talvez faça algum sentido na atual sociedade em que vivemos.

Dito isso tudo, o filme ainda tem um final satisfatório, que vai agradar os fãs mais ávidos. Para o público geral ele não passa de um thriller policial com pouca criatividade e umas armadilhas meio sangrentas. A nota dá pra parar no meio termo. Espiral terá pré-estreias a partir de 10 de junho e a estreia oficial em 17 de junho.

Espiral - O Legado de Jogos Mortais

Nome Original: Spiral: From the Book of Saw
Direção: Darren Lynn Bousman
Elenco: Chris Rock, Samuel L. Jackson, Max Minghella, Marisol Nichols
Gênero: Crime, Horror, Mistério
Produtora: Lionsgate
Distribuidora: Paris Filmes
Ano de Lançamento: 2021
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