Jack Ryan – 2ª temporada, troca de espionagem por ação
Mas o valor de entretenimento se mantém em alta
Em Jack Ryan – 2ª temporada, o protagonista de John Krasinski (ainda mais confortável no papel) não é mais o analista ingênuo que conhecemos. Ele recusou a proposta de emprego de James Greer (Wendell Pierce, sempre em boa química) na Rússia, e seguiu crescendo em seu trabalho nos Estados Unidos. Mas os caminhos dos dois se cruzam novamente na Venezuela, diante da suspeita de que o presidente local, Nicolás Reyes (Jordi Molla, em uma alusão óbvia, claro, a Nicolás Maduro), esteja supervisionando algo ilegal que pode se tornar uma grande ameaça internacional.
Com essa premissa, o roteiro todo se constrói muito bem como um legítimo thriller político, porém agora nadando por outras paragens. Se o primeiro ano recebeu honestas comparações com Homeland e 24 Horas, a segunda temporada se aproxima de algo mais semelhante a Missão Impossível, o que jamais é um problema, apenas pode causar um estranhamento ao fugir da proposta original, que foi tão bem aceita por público e crítica em 2018.
Os diálogos com o mundo contemporâneo, não só com a Venezuela, mas também com o Brasil e principalmente o Chile, são ouvidos à distância. Mesmo que os EUA sempre se oponham aos inimigos do planeta, esquecendo de olhar para o próprio umbigo.
Jack Ryan – 2ª temporada
A história ainda traz dois novos rostos importantes. Temos Mike November (o ótimo Michael Kelly), chefe da CIA na Venezuela, responsável por parte dos melhores momentos do segundo ano; e Harriet (Noomi Rapace), mulher misteriosa que tem sua própria missão. Entretanto, ela sofre com o roteiro repleto de subtramas, sendo esquecida em alguns momentos e nunca passando pelo Teste de Bechdel.
Aliás, a personagem de Abbie Cornish, interesse romântico do ano anterior, sequer é citada por aqui, uma ausência sentida. Vale a atenção ainda a outras figuras do elenco, que brilham sozinhas, como o mercenário alemão Max Schenkel (do ameaçador Tom Wlaschiha); o político venezuelano Miguel Ubari (Francisco Denis, bem humanizado); e a candidata da oposição Gloria Bonalde (vivida pela lindíssima Cristina Umaña), que representa um perigo para Reyes nas eleições.
Com um enredo enervante, envolvendo o assassinato de um senador americano e grande amigo de Ryan, um traidor entre os “heróis” (que eu descobri meia hora antes da revelação, talvez pela sua suspeita vir de uma construção clichê), uma cativante perseguição pelas ruas de Londres, uma subtrama cansativa em meio a selva venezuelana (que tenta emular O Resgate do Soldado Ryan sem sucesso), o segundo ano oscila entre a perda da identidade da série e a criação de uma nova, mas que necessita de um resgate para a terceira temporada.
Considerações finais
A graça de Jack sempre foi seu lado analítico e cerebral. Ao torná-lo um homem de ação, a produção se descaracteriza, ainda que a premissa dessa vez exija mais do corpo do que da mente, os espectadores esperam certa coerência quando se trata de um seriado.
Por outro lado, a história recompensa seu consumidor com um forte elenco, um alto valor de produção e entretenimento de primeira, ainda mais quando chegamos ao impressionante clímax nos dois últimos episódios, divididos entre uma turbulenta votação (que evoca até um regime ditatorial) e um plano sagaz envolvendo soldados patriotas norte-americanos com mercenários contra um campo de concentração. Jack Ryan, assim, pode ainda não ter encontrado voz própria, mas não desaponta no que se propõe a fazer: salvar o mundo, enquanto desobedece todas as ordens.