No Coração do Mundo, drama em Minas Gerais
Acompanhando a trajetória de alguns seres da periferia de Contagem, na Grande Belo Horizonte (terra natal dos diretores), sua falta de perspectivas e o desejo em alguns deles (sobretudo os mais novos, como era de se esperar) de mudar o rumo de suas vidas (por vezes de maneira precipitada), os diretores, Gabriel Martins (O Nó do Diabo) e Maurílio Martins (Temporada), a partir dessa proposta já batida, decidem conduzir a trama de No Coração do Mundo buscando valer-se de alguns elementos familiares a eles, através dos maneirismos, das gírias e do ambiente. O resultado é um relato que oferece alguns bons atrativos.
A aposta em interpretações as mais naturais possíveis (os atores passam uma sensação de amadorismo a todo momento) e o uso do sotaque mineiro de BH, em que os personagens falam sem praticamente mexer os lábios, levando a um quase sussurrar difícil de entender, exige uma captação de som que aqui está acima da média dos filmes nacionais. A sonoplastia também está precisa e apoia as sensações nos momentos em que elas devem ser impressas no público (sons de tiros e ruídos da rua).
No Coração do Mundo
Um dos méritos do filme é nos aproximar dos personagens através de suas ações banais do cotidiano. O roteiro oferece-nos a autonomia para decidir se gostamos ou não desses personagens sem utilizar subterfúgios fáceis para cativar a plateia, como relacionamentos piegas ou idealizados; assim, não veremos romantismo barato. A sintonia com Marcos (Leo Pyrata), Selma (Grace Passô), Ana (Kelly Crifer), Rose (Barbara Colen), Brenda (MC Carol de Niterói) é proposta a partir da empatia ao dia-a-dia deles, difícil para várias plateias.
Assim, assume-se que o Coração do Mundo é onde se deseja estar; vemos indivíduos que procuram (ou não) uma saída para a vida sem perspectivas. E os planos de fuga são forjados sem esmero, dentro das possibilidades que o ambiente lhes propõe. Isso concebe ao filme um viés naturalista.
A escolha por narrar as peripécias de várias pessoas simultaneamente, entretanto, é arriscada; de fato, isso dá à narrativa uma complexidade maior do que era necessária e um perigoso resvalar na lentidão. É bom entrar no cinema ciente das 2h de uma história com ritmo parecido com o da sua própria vida.
Fica um destaque para a trilha sonora (“Negro Drama”, dos Racionais MC’s; “Texas”, de MC Papo, em particular, bem posicionadas em seus respectivos instantes), num filme do qual, a princípio, pode-se não esperar muito, mas que merece uma boa carreira no circuito.