O Amigo do Rei, doc com toques de ficção
Chega aos cinemas no dia 8 de agosto o filme O Amigo do Rei, dirigido por André D’Elia (Ser Tão Velho Cerrado). Este é o primeiro lançamento do programa O2 Play Docs da distribuidora O2 Play ocupando salas de cinema em 17 cidades brasileiras com sessões em horário nobre.
16h20 de 5 de novembro de 2015. Após cerca de 50 minutos depois da identificação de um vazamento na barragem do Fundão, a lama de rejeitos da extração de minério de ferro da Samarco, um empreendimento conjunto da BHP Billiton e da Vale S.A., duas gigantes do setor de mineração, muda de maneira duradoura a paisagem não só das áreas de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo, pertencentes à cidade de Mariana (MG), mas também de todo o ecossistema associado ao Rio Doce, chegando a sujar o Oceano Atlântico à altura do litoral do Espírito Santo. E enterra não só vidas e casas, mas a história de pessoas. Deixa, assim, digitais barrentas na moderna História do Brasil.
Mar de lama nunca mais
Tendo como motivação esse que é o maior desastre ambiental produzido por ação industrial do planeta em todos os tempos e tendo como suporte dramático evidente o sofrimento das comunidades afetadas e que buscam justiça, o diretor André D’Elia decide estender a cerca de 140 minutos o seu O Amigo do Rei. Enxerta então cenas de ficção (ao acompanhar as ações do deputado Federal Rey Naldo no Congresso Nacional e na sua relação com forças importantes do jogo político) às falas de quase todos os possíveis atores importantes envolvidos no rescaldo da tragédia.
Sim, a metragem do longa assusta, e ainda mais quando se sabe que se trata de um documentário. Pouco havia a se fazer com relação a isso a partir da opção do diretor em expor as falas de tanta gente. Ele cobre com atenção todas as nuances de desdobramentos do episódio fatídico. Mas não se assuste. O tempo passa rápido aqui, enquanto que, para os afetados, o que foi um pesadelo não parece acabar.
O Amigo do Rei
Deve-se levar em conta que um bom documentário observativo depende de uma boa edição e de uma acertada escolha dos falantes. Nesse caso, como há muitos aspectos a se considerar na análise das consequências do evento sem uma linearidade temporal (aspectos políticos, ambientais, econômicos e sociais), a questão da montagem se torna ainda mais importante, pois um lance ágil pode significar prender a atenção do espectador por tanto tempo. Além disso, é fundamental que se exponham indivíduos carismáticos. E, na junção desses dois
detalhes, a longa duração do filme não será um fardo para quem assiste.
Nesses quesitos, O Amigo do Rei se sai bem. Além disso, é um filme conservador. Segue uma cartilha básica de condução do espectador ao enxertar inclusive falas de defesa das mineradoras. E dá aos diferentes objetos de estudo narrativos mais ou menos o mesmo tempo. Há falas dos ex-moradores de Bento Rodrigues, indígenas, moradores de Mariana, ambientalistas, intelectuais, técnicos, políticos. Ou seja, a vontade de fazer um apanhado amplo e plural acaba por segurar a onda.
Doc + ficção
Aqui se toma partido de um lado. Os momentos ficcionais reforçam o posicionamento político, e as atuações de Luciano Chirolli (Rey Naldo), Toni Giusti (um empresário) e Rafael Golombek (senador) satisfazem; ressalvas a fazer, entretanto, a algumas cenas excessivamente caricatas ou pouco críveis que deixam a bola cair um pouco. É tentador partir pro escracho fácil ao se tratar os políticos brasileiros. Ridicularizá-los vira senso comum e perigoso por enfraquecer uma discussão séria que deve ser feita.
Entre virtudes e falhas, no entanto, vá de encontro a este O Amigo do Rei: ao nos brindar com certo ar profético, ele representa o saudável movimento que busca eternizar os erros do passado histórico para que não os repitamos. Mesmo que no fim os repitamos.