O Homem Que Matou Dom Quixote, de Terry Gilliam

uO Homem Que Matou Dom Quixote é o novo filme de Terry Gilliam, cuja produção demorou 30 anos para ser concluída.

O cineasta Toby (Adam Driver) está na Espanha gravando um filme baseado no livro Dom Quixote de La Mancha, quando se lembra que o seu filme de conclusão de curso também tratava desse assunto e que foi filmado em uma cidade perto de onde ele está.

Toby então, resolve voltar à cidade para ver como estão os atores do filme, que eram locais. Chegando lá, ele descobre que o homem que interpretou Dom Quixote (Jonathan Pryce) enlouqueceu e acha que é o próprio personagem. E, ainda por cima, confunde Toby com Sancho Pança.

A origem de O Homem que Matou Dom Quixote

A história da produção de Terry Gilliam começou em 1989, quando ele teve a ideia para fazer um filme a partir da obra de Miguel de Cervantes. Em 1991, Gilliam começou a escrever o roteiro e em 1998, a produção começou.

Johnny Depp, Jean Rochefort e Vanessa Paradis foram escalados para os papéis principais. No entanto, logo no começo das filmagens tudo pareceu dar errado. A locação ficava sob uma rota de aviões e o barulho atrapalhava a captação do áudio; uma tempestade atacou o lugar e além de destruir equipamentos, interrompeu as filmagens.

Os problemas em relação ao filme prosseguiriam com os anos. Jean Rochefort foi diagnosticado com dupla hérnia de disco e abandonou o filme, assim como Depp e Paradis. Outros atores foram escalados, entre eles Gérard Depardieu e Robert Redford. Mais tarde, John Hurt, mas foi diagnosticado com câncer no pâncreas e abandonou o projeto. Ewan McGregor entrou para substituir Depp, mas mesmo assim o projeto não foi para frente.

O elenco final do filme foi escolhido em 2016, e mesmo assim O Homem Que Matou Dom Quixote continuou com problemas de financiamento. Tanto Jean Rochefort, o primeiro ator cotado para interpretar Dom Quixote, quanto John Hurt, morreram em 2017, antes do filme ser lançado. Enfim, em 2019, O Homem Que Matou Dom Quixote finalmente chega às telas de cinema.

Uma versão de Dom Quixote

Embora possa parecer que o filme é baseado no livro, isso não é exatamente verdade. O correto seria dizer que o filme faz uma releitura do clássico de Cervantes. Afinal, acompanhamos um diretor que persegue tanto Dom Quixote, que no final, Quixote acaba atrás dele.

Da história do livro mesmo, vemos apenas os momentos de filmagem e algumas cenas do filme dentro do filme. Mas a trama principal do filme, embora gire em torno de um homem que acredita ser Dom Quixote porque interpretou Dom Quixote no cinema, assim como o próprio Quixote acha que é cavaleiro, não é uma adaptação fiel do livro.

Por outro lado, muitas das coisas que acontecem durante a filmagem e durante a visita de Toby à cidadezinha são espelhos do que acontece no livro. Por isso, é obvio que a figura criada por Cervantes é extremamente importante no contexto do filme. E sem o livro, esse filme não faria qualquer sentido.

O poder do diretor

O Homem Que Matou Dom Quixote é interessante no sentido de falar sobre a indústria cinematográfica e, nesse aspecto, ele é metalinguístico. Ele começa com uma cena do romance, que parece fazer parte do filme de Gilliam, mas na verdade, faz parte do filme de Toby.

O longa também mostra com muita clareza todo o poder de influência que o diretor tem. Quando Toby grava com não atores de uma pequena cidade, ele acaba influenciando a vida de todas essas pessoas. Assim, depois que ele vai embora, a cidade nunca mais é a mesma.

O caso do homem que acredita ser Dom Quixote depois de interpretar o personagem no cinema é o caso mais esdrúxulo. Mas também acompanhamos Angelica (Joana Ribeiro), que se viu completamente envolvida com o diretor, e acreditou quando ele disse que ela podia ser uma grande atriz. Depois que Toby foi embora, Angelica saiu da cidade para tentar uma carreira no cinema e não foi exatamente bem-sucedida. O Homem Que Matou Dom Quixote não poupa o diretor de suas responsabilidades em relação aos seus atores, e usa isso como uma maneira de fazer Toby refletir e mudar seu comportamento.

Aspectos técnicos

O Homem Que Matou Dom Quixote tem algumas semelhanças com outros filmes de Gilliam. Ele também trabalha com alguns aspectos fantásticos, embora eles estejam mais reservados às filmagens do filme de Toby. Por outro lado, diferentemente de seus filmes mais antigos que usavam bastante efeitos, este não tem tanto. Por exemplo, as cabeças de gigante que fazem parte do cenário, de fato estão lá. O filme é bem colorido, e algumas composições de cena remetem o espectador diretamente a quadros.

O longa é inteiramente metalinguístico, o tempo todo se fala de cinema e se vê o cinema sendo feito dentro do cinema. Gilliam nos coloca dentro de uma produção cinematográfica que muito facilmente poderia ser a sua. Em um determinado momento, Toby, enquanto conversa em espanhol com os locais, empurra as legendas para o lado dizendo “nós não precisamos disso” e começa a falar inglês, quase como se fizesse piadas com filmes americanos que se passam fora dos Estados Unidos, mas onde todos falam inglês. Ou seja, o próprio filme de Gilliam faz a mesma coisa.

No entanto, o filme parece não conseguir seguir um rumo lógico. Não que ele seja fantasioso, ou que faça parte de um universo fantástico, tão comum na obra de Gilliam. O filme simplesmente não explica muitas das situações ao público e como ele não se denomina como nonsense, O Homem Que Matou Dom Quixote só soa como um filme confuso.

Considerações finais

O fato de ter alguns personagens que não tem qualquer sentido na trama, como o casal Patrão (Stellan Skarsgård) e Jacqui (Olga Kurylenko), só prejudica o filme mais um pouco. No final, O Homem Que Matou Dom Quixote só nos apresenta uma série de personagens peculiares e tão confusos quanto o espectador ao final da sessão.

Claro que o longa tem seus méritos. É bem produzido, tem boas atuações e é esteticamente bonito, mas parece se perder no roteiro. O Homem Que Matou Dom Quixote entra em cartaz no dia 30 de março, exclusivamente na rede Cinépolis.