Tel Aviv em Chamas, o humor árabe

Pra quem passa o olho na lista de países responsáveis pelo longa Tel Aviv em Chamas, ele pode parecer um Frankenstein de várias culturas: o filme é uma co-produção França – Bélgica – Israel – Luxemburgo e, inclusive, foi a escolha de Luxemburgo para concorrer na categoria “Melhor Filme Estrangeiro” deste ano, mas acabou não sendo indicado.

Essa lista de países soa estranha após ver o filme, já que ele poderia se identificar muito mais como uma co-produção Israel-Palestina. Pena que, por conta de uma pequena desavença que já dura mais de 50 anos, uma co-produção do tipo soa impossível.

Tel Aviv em Chamas – O riso dos outros

Como um entusiasta do mundo da comédia, me interessa muito como funciona o humor dos outros países. Apesar de, em grande parte, a comédia ser universal, os hábitos culturais influenciam muito no que um povo acha engraçado. Inegavelmente, a mais popular das culturas cômicas é a norte-americana, por conta de seus enlatados televisivos, melhores stand-ups e produções exportadas. O humor inglês, de Monty Python e The Office (o original, de Ricky Gervais) ganhou seu espaço criando uma categoria própria.

Tel Aviv em Chamas

O humor brasileiro, em sua maioria, é uma linha completamente própria e a diferença dela para o humor americano é gritante. Por isso, quem está acostumado com as comédias Hollywoodianas não consegue entender como Minha Mãe é Uma Peça 3 se tornou o filme mais lucrativo do cinema nacional ou por quê “Zorra Total” e “A Praça é Nossa” continuam na grade de programação das maiores emissoras do país. Mas a verdade é que esse é o humor brasileiro: de personagens caricaturados e bordões grudentos.

Assim sendo, foi com grande curiosidade que eu cheguei para assistir Tel Aviv em Chamas.

Empatia nacional

Baseado unicamente nesse filme, eu posso dizer que eu gostei do humor israelense. Mais do que isso: muito da cultura e temas de piadas dos israelenses são muito próximos da nossa própria cultura. Na história, Salam é um assistente de produção de uma série televisiva popular tanto na Palestina quanto em Israel, chamada “Tel Aviv em Chamas” – e que parece mais uma novela, na verdade: é a história de uma espiã palestina que se apaixona por um militar israelense.

Salam é palestino, mas a caminho do trabalho, tem que passar diariamente num checkpoint de fronteira, onde ele conhece o oficial israelense Assi Tzur. O capitão, usando todo o seu abuso de autoridade, começa a dar pitacos e interferir no roteiro da série na mesma medida que Salam vai sendo promovido e se tornando roteirista da novela.

O enredo mostra que muitos elementos-alvo do humor israelense são muito próximos de elementos-alvo de nosso próprio humor: as meta-piadas com nossas novelas e o desdém às autoridades também são temas recorrentes nas comédias nacionais. Os personagens civis são constantemente obrigados a se submeter aos abusos das escalas superiores hierárquicas e estão sempre sonhando em sair do país para viver fora (França é o destino do sonho aqui. “Lá não tem ocupação”, um dos personagens diz).

Comédia sem piadas

É um humor diferente também do que estamos acostumados a ver no cinema; e nesse ponto ele está mais próximo do humor europeu (inglês e francês, principalmente) do que do humor americano. Não há gags ou piadas pontuadas, a comédia está na situação.

O ator que interpreta Salam (Kais Nashif, uma espécie de Paulo Betti palestino) é excelente e eu quero muito ver mais filmes com ele. Kais consegue dar uma leveza e graça ao protagonista aparentemente sem esforço: Salam calado e parado já soa cômico e eu não sei dizer o porquê.

Tel Aviv em Chamas

Aos árabes

Muitas situações no filme podem parecer exageradas, e o exagero deve ser parte da construção da piada. Nesses pontos, parece que estamos perdendo algo, mas isso se deve ao nosso desconhecimento da realidade vivida por eles.

O público alvo do filme são os árabes, tanto palestinos quanto israelenses. E isso é um ponto forte da produção, pelo menos no meu interesse a ver a obra. A busca era entender mais da cultura árabe e sua comédia e, (mesmo não sendo propriamente engraçado) nesse propósito, Tel Aviv em Chamas cumpriu muito bem seu papel.

E também me fez sair do cinema com vontade de comer homus, o que é outro ponto positivo. O filme entra em cartaz essa semana, dia 19 de março.

Tel Aviv em Chamas

Nome Original: Tel Aviv on Fire
Direção: Sameh Zoabi
Elenco: Kais Nashif, Lubna Azabal, Yaniv Biton
Gênero: Comédia, Drama, Romance
Produtora: Samsa Film
Distribuidora: Pandora Filmes
Ano de Lançamento: 2018
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