O Castelo Animado – Studio Ghibli

A vaidade e a guerra são discutidas em obra sensível sobre a instabilidade do tempo

Baseado no livro homônimo da escritora inglesa Diana Wynne Jones (lançado por aqui pela Galera, selo da Editora Record), O Castelo Animado é mais uma animação do Studio Ghibli dirigida pelo mestre Hayao Miyazaki. Este imprime na história outros elementos pelos quais é apaixonado, como o “homem mágico de alto nível social” (“A Viagem de Chihiro“, “O Reino dos Gatos“, “Princesa Mononoke“); a garota comum passando por uma transformação inusitada (Chihiro e Reino dos Gatos novamente, “Ponyo“); a aviação (praticamente a maioria de seus longas), entre outros signos típicos do autor, que contribuem não só para dar uma unidade aos seus trabalhos, como confere uma sensação agradável de familiaridade na obra, por mais que cada história não seja igual a outra.

Também é identificável a naturalidade com que seus personagens lidam com o fantástico (como já visto tanto em Chihiro como em “Meu Amigo Totoro“); não existe uma descrença da pessoa que ouve do outro que viveu uma experiência mágica, tudo é aceito e debatido como qualquer outro assunto. Esses pequenos detalhes mostram que quando se trata de Ghibli, a magia não tem que ser discutida. O que importa por aqui são os gestos de seus personagens e o que eles vão fazer com as oportunidades que lhe são oferecidas.

O Castelo Animado

O Castelo Animado – uma fábula sem igual

A transformação de Sophie em idosa serve apenas como desafio físico (mas nem tanto) e não como uma espécie de aprendizado. Isso seria bem típico em uma produção da Disney ou da Dreamworks. Afinal, ela sempre foi uma moça bondosa e humilde. Inclusive, esse avanço na idade só a torna uma pessoa melhor do que já era e enaltece sua empatia e amor por todos.

Aliás, bons sentimentos são outras das características que Miyazaki busca sempre trazer em suas animações. Mesmo a Bruxa do Nada, apresentada como uma possível vilã no início, é digna de pena e de completa compaixão pela protagonista. Sophie até passa a cuidar dela depois de certo momento, fazendo com que o público goste da velhinha “derretida” no canto da sala também.

Já o grande mago Howl, por exemplo, é simpático com todos e sorri mesmo para os adversários. Ele esconde por trás de toda aquela máscara uma perturbação forte pelo monstro que vem se tornando após o pacto que lhe deixou sem coração. O divertido Calcifer, mesmo sendo um demônio, coloca aquele castelo para andar (literalmente) e consegue ser infinitamente mais interessante em seu estereótipo do que Mushu, Phil ou Sebastião (de “Mulan“, “Hércules” e “A Pequena Sereia“, respectivamente). E o que dizer de Markl e Cabeça de Nabo? Ambos são pura e legitimamente gentis, de enorme coração.

Quem é o vilão?

Não há a figura de um vilão na história e ainda que Madame Suliman represente um desafio à altura, o inimigo ou é representado de maneira monstruosa (seja com as criaturas que servem as duas bruxas em momentos distintos do enredo) ou é “invisível”, pois é mostrado apenas na “forma” de aviões de combate explodindo vilarejos e inocentes por onde passam.

A guerra, então, seria o verdadeiro mal sem rosto, gesto de homens perdidos em seus ideais banais. Porém, o foco da trama se dá na rotina de Sophie limpando o castelo (o que rende momentos engraçadíssimos), no drama que Howl esconde, mesmo sendo um ser super heróico, e na relação que é desenvolvida pela família improvável que se forma dentro daquela moradia andante, enaltecendo o amor romântico e fraternal em igual medida.

O Castelo Animado

Mais uma vez e muito a frente de seu tempo, Hayao Miyazaki subverte o gênero e coloca a mulher em igualdade, sempre com protagonistas fortes sem deixar a feminilidade de lado, enquanto preserva a força de um conto de fada tradicional, com plebeus, príncipes e magos. No mais, essa animação serve para o autor desenvolver questões relacionadas ao tempo, moldável como o é, indo e vindo sem linearidade, representado de maneira fluída na protagonista, ora idosa, ora jovem, ora adulta e vice-versa, versa-vice.

Sem defeitos?

O desfecho, talvez, seja o único ponto fraco e fora da curva, feito com resoluções apressadas e pueris, como se a direção estivesse com urgência em finalizar a obra, deixando algumas coisas jogadas no final.

Entretanto, tecnicamente impecável, O Castelo Animado é uma das grandes produções do Ghibli a fazer bom uso da computação gráfica, sem que ela atropele a animação tradicional. Se desde 1984 o estúdio já realizava animações com detalhes minuciosos de elementos de cenário, figurino e personagens de fundo, aqui isso é elevado a um nível além, enquanto Miyazaki conta uma história de amor e restituição (de si e dos eventos da humanidade), desprendido do tempo.

O Castelo Animado

Nome Original: Hauru no ugoku shiro
Direção: Hayao Miyazaki
Elenco: Vozes de Chieko Baishô, Takuya Kimura, Tatsuya Gashûin
Gênero: Animação, Aventura, Família
Produtora: Studio Ghibli
Distribuidora: Buena Vista International
Ano de Lançamento: 2004
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