La Casa de Papel, um thriller com charme latino

La Casa de Papel acompanha um homem chamado de Professor, vivido por Álvaro Morte, recrutando um grupo de pessoas com habilidades específicas para algo que planeja há tempos: um roubo de proporções homéricas. Enquanto ele tem o plano perfeito, Tokio (Úrsula Corberó), Rio (Miguel Herrán), Nairóbi (Alba Flores), Berlim (Pedro Alonso), Moscou (Paco Tous), Denver (Jaime Lorente), Helsinque (Darko Peric) e Oslo (Roberto García Ruiz) têm as habilidades necessárias para colocá-lo em ação – todos têm nomes de cidades para protegerem a própria identidade dentro do grupo.

O Professor
O Professor

Do outro lado da balança estão os negociadores, liderados por Raquel Murillo (Itziar Ituño), uma mulher que precisa lidar com o descrédito de colegas de trabalho machistas e com o drama particular de ter sofrido violência doméstica do ex-marido, também policial, colocando em risco a guarda de sua filha. São evidentes as várias referências espalhadas ao longo da produção, que colaboram para o impulsionamento do enredo. Desde o corte de cabelo à lá Mathilda (de O Profissional) que Tokio usa, passando pela máscara de Dalí (que imediatamente nos remete a de Guy Fawkes, ainda que sem a importância política ou social de V de Vingança), até o roteiro que bebeu muito da fonte de O Plano Perfeito, filme de assalto de 2006 que também trazia um impressionante jogo de gato e rato entre polícia e ladrão.

Embalados por uma trilha cheia de gravidade (Manel Santisteban e Iván Martínez Lacámara certamente se inspiraram em Hans Zimmer) e uma abertura melancólica pegajosa (“My Life Is Going On”, trabalho certeiro de Cecilia Krull), é em “Bella Ciao” que o espetáculo toma forma envolvente (a canção repetida inúmeras vezes entre os episódios foi o hino da resistência contra a política fascista de Benito Mussolini na Itália).

Dois elementos são os fatores de sucesso da série de 22 episódios, aqui no Brasil dividido em duas partes pela Netflix: o primeiro é o grande golpe arquitetado pelo Professor, sempre um passo à frente da polícia, o que fornece as melhores reviravoltas da trama. Quando achamos que ele foi pego, ou descoberto, ou com um furo no plano, percebemos que não é bem verdade e ele já tinha o próximo gancho em andamento. O Professor, tal qual Kira de Death Note, é metódico, inteligente e frio na medida para executar sua obsessão, realizando cada ato sem perder o carisma. Por isso, o personagem, ao lado de sua amada e inimiga não declarada Delegada Murillo (e seu viés de empoderamento não panfletário muito bem realizado), são as melhores figuras em tela. Juntos, os dois surpreendem o público do começo ao fim, sem abandonar a humanidade, encontrando o equilíbrio ideal de romance com ação. Ação essa, aliás, que é intensa e vigorosa, com os 8 ladrões dentro da Casa da Moeda, engatando um gesto no outro, da falha humana a grandes sacadas, que nunca deixam a história cansar.

Os negociadores
Os negociadores

O segundo elemento é o fator humano que reside justamente na interação entre os personagens. Além do casal improvável principal, temos ainda outros casais absurdos que são formados dentro do alvo da ação, e é justamente essa melação de novela que confere personalidade à produção, não permitindo que ela seja só mais um thriller de assalto pasteurizado. Nessa parte do elenco, Berlim é o destaque, segundo na cadeia de comando e cheio de tiques vilanescos, consegue manter o plano funcionando mesmo com todos os desvios e ainda que ele seja um crápula em mais de um sentido, é o que traz alívio quando algum moleque tenta alterar o que não deveria ser mexido. Moscou é o coração da obra, Nairóbi é a sensata e Helsinque um alívio que oscila entre brutalidade e sensibilidade. O problema mesmo reside na parte jovem do elenco, que quase arruína a série em vários sentidos. Tokio é simplesmente insuportável. A personagem, que a princípio parecia ser a protagonista por dar voz da narrativa, é impulsiva e merdeira, atrapalhando praticamente todos os grandes pontos do enredo. Rio é ingênuo, bobo e nunca sabe o que quer, por isso é prazeroso sempre vê-lo se lascando, como punição pela imaturidade irritante. E Denver, que não só tem um péssimo ator por trás do mancebo que conquista o coração de uma refém, como também desgasta o público nas interação emocionais com o pai. Ainda que a revelação de passado de alguns ladrões seja necessária para gerar empatia, muitas vezes esses momentos soam piegas e bregas, o que quase forçam um acelerar na timeline para a parte que realmente importa: a treta entre os ladrões e o grande golpe em andamento. E nem falaremos do inútil do Arturito, construído pra ser o pícaro do plot, que é incapaz tanto de executar o que pretende, quanto de ganhar o espectador.

Os ladrões
Os ladrões

Dentre os acertos da série, temos as falhas fora da Casa da Moeda. Assistir ao Professor improvisando é ainda melhor do que quando ele está fazendo seus origamis calculadamente sobre a mesa de operações. Os roteiristas são espertos e deixam várias pistas e itens ao longo da história, que podem ajudar os ladrões ou derrubá-los, gerando assim um equilíbrio importante, onde o maniqueísmo é quebrado e coloca o público ora torcendo pro sucesso do golpe, ora torcendo pra ação policial, misturando os conceitos de “certo e errado”, enquanto homenageia outras grandes obras policiais e de assalto e que deixariam Christopher Nolan orgulhoso em mais de um sentido.

Berlim
Berlim

La Casa de Papel poderia ter alguns episódios a menos e investido pouco nas breguices entre os personagens, mas não perde o tom e fornece um espetáculo narrativo estiloso e cheio de vigor, revelando que não são só os americanos e ingleses que são capazes de realizar um thriller envolvente do gênero, com um charme que só os latinos conseguem aplicar.

La Casa de Papel

A série mais falada dos últimos tempos justifica seu sucesso ao realizar boa mistura entre thriller de roubo com intensidade emocional de novela.

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