A Ligação – narrativa enervante e primorosa

Suspense atemporal fala sobre maternidade e probabilidade

Os sul-coreanos surpreendem novamente, com este thriller de primeira qualidade e com uma trama improvável, tal qual é costumeiro em seus textos, de navegar por várias vertentes e seguir surpreendendo o público até o último segundo. Portanto, e mesmo sem spoilers por aqui, se não quiser estragar sua experiência, primeiro veja o filme A Ligação, depois volte a esta crítica.

Anotem esse nome: Lee Chung-Hyun escreve e dirige essa produção, que narra a história de uma moça que retorna a antiga casa de sua família, onde passa a receber ligações de um velho telefone sem fio… de uma moça da mesma idade, situada 21 anos no passado, em 1999, que também está na mesma casa e que, à primeira vista, se mostra em apuros, vindo a estabelecer uma curiosa amizade com a protagonista do nosso presente, o que repercute em desastrosas consequências posteriormente. As comparações com ”Alta Frequência” (filme de 2000, com Jim Caviezel e Dennis Quaid) param por aqui, no terreno de estruturar a narrativa da mesma forma, mas aqui a situação é outra.

A Ligação

A Ligação

Chung-Hyun, à maneira do seu conterrâneo Bong Joon-ho (dos excelentes ”Okja” e ”Parasita”), compõe o andamento do enredo com muita ousadia e personalidade, explorando vários gêneros e fazendo com que todos funcionem organicamente (do drama ao suspense, do terror psicológico ao horror gore, indo até a mais pura ficção científica etc.), amparado por um ótimo elenco (todos brilham, mas a dupla Park Shin-hye e Jeon Jong-seo está acima da média, conseguindo trazer empatia, emoção e ira em composições muito distintas e sutis), por uma ambientação intimista e minimalista (mesmo com outros poucos cenários explorados, o foco se dá nas várias versões temporais da casa) e pelo texto poderoso, inventivo e intrigante, que consegue segurar a atenção do público do começo ao fim.

Brincando ainda com probabilidades (algo que qualquer história sobre “viagem no tempo” pede – ainda que não tenhamos a “viagem aqui”), o cineasta usa e abusa de novas situações, à medida que a mínima ação é realizada no passado, vindo a refletir no presente, desde uma marca na parede, até a morte de alguém.

Mistura de gêneros

Saltando do drama de duas mulheres que criam fortes laços de amizade para o terror de perseguição com serial-killer, A Ligação também discute efeitos da maternidade tóxica (na qual as duas jovens são afetadas de diferentes maneiras) como pano de fundo, enquanto vai apertando cada vez mais o parafuso e sufocando o espectador numa história sem saída, onde o aumento de tragédias é inevitável.

E mesmo assim, Chung-Hyun pega o público no contrapé, relacionando um evento com uma reviravolta e jamais deixando que esses recursos sejam gratuitos. Sim, o filme também deixa escapar alguns pequenos furos aqui e ali (nunca fica claro os sentimentos da protagonista com sua mãe e porque ela acendeu o forno, ou de certa confusão que é montada com alguns lugares), mas nada que danifique a produção, que sabe usar drama, temporalidade e terror para contar uma história original, que só os sul-coreanos sabem fazer.

Não deixe esse filme passar por você. Atenda a ligação.

A Ligação

Nome Original: Kol
Direção: Chung-Hyun Lee
Elenco: Park Shin-Hye, Jong-seo Jun, Sung-ryung Kim
Gênero: Crime, Horror, Mistério
Produtora: Yong Film
Distribuidora: Netflix
Ano de Lançamento: 2020
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