Boas Intenções, aquilo do qual o inferno está cheio

Isabelle (Agnès Jaoui) é uma professora que quer ajudar todo mundo. Cheia de Boas Intenções, ela dá aulas de francês para imigrantes. Enquanto isso, seu casamento está em crise e seus filhos acreditam que a mãe liga mais para as pessoas que ajuda do que para eles.
Quando uma nova professora (Claire Sermonne) chega à escola e parece agradar mais seus alunos que Isabelle, ela fica enciumada e resolve dar um passo mais longo, ajudando seus alunos a tirar carteira de habilitação.
Isabelle
Isabelle é retratada como uma mulher que só pensa em fazer caridade e que está extremamente envolvida em causas sociais. Ela trabalha como professora de refugiados e aceita receber um salário bem baixo, porque seu objetivo é ajudar.

No entanto, Isabelle parece não saber muito bem como fazer caridade. Enquanto dá aulas, ela faz diversos comentários xenofóbicos, que não passam despercebido nem pelos seus alunos.
Quando Elke, a nova professora, aparece e Isabelle percebe que os alunos parecem gostar mais da aula dela, a protagonista se sente traída e tem sentimentos extremamente egoístas. Ainda mais para uma pessoa que supostamente pensa primeiro no bem dos outros. A impressão que se tem é que Isabelle está meio perdida e que embora ela tente, e o espectador consiga reconhecer seu esforço, ela não consegue sequer entender como fazer caridade.

Estrangeiros
Outro tópico que ronda Boas Intenções é a migração, um assunto que está em voga e que deve ser discutido. Infelizmente o filme não parece fazer isso de maneira séria. Isabelle pode até querer ajudar essas pessoas, mas ela solta comentários preconceituosos e sem muito conhecimento a todo o momento. O marido (Tim Seyfi) dela, um imigrante, não consegue se compadecer da situação de nenhuma das pessoas que Isabelle tenta ajudar e a mãe de Isabelle não faz nenhum esforço para entender o ponto de vista da filha.
O problema maior por sua vez se dá na maneira com que Boas Intenções retrata os migrantes. Isabelle tem uma sala com alunos de todos os cantos do mundo e que, embora estejam aprendendo francês, em diversos momentos do filme falam a língua com perfeição. Mas mesmo assim, os imigrantes aparecem quase como selvagens estereotipados.

A personagem que veio da China, por exemplo, é especialista em massagem erótica; a da Bulgária reclama que seu país é conhecido pelas prostitutas e não por acaso também é a personagem mais sensual do filme; o personagem brasileiro, vive com uma camisa da seleção brasileira. Além disso, o filme parece fazer uma distinção bem clara entre os franceses, civilizados, que ajudam os outros, e os migrantes, que queimam papéis, falam alto e destroem o que pertence à outras pessoas.
Beirando o absurdo
Em uma cena que soa absurda para qualquer pessoa que tenha o mínimo de conhecimento do mundo, Thiago (Nuno Roque), o imigrante brasileiro, começa a jogar ovos Fabergé em um aquário, como se fosse uma criança de cinco anos. O momento parece surreal porque mesmo que Thiago não tivesse a menor ideia do que é um ovo Fabergé, nenhuma pessoa adulta joga objetos de outras pessoas em aquários.

A impressão que temos nessa cena é que no Brasil as pessoas não são muito inteligentes, nem tem muito conhecimento. E que, ainda por cima, são mal educadas a ponto de estragar a decoração da casa dos franceses.
Aspectos técnicos de Boas Intenções
Este é um filme simples, mesmo porque sua trama não exige uma grande produção. O filme se preocupa basicamente em reproduzir os poucos ambientes onde a história se passa, que são a escola onde Isabelle dá aula, a auto escola e a casa da protagonista.
Pode-se dizer que existe uma grande variedade de figurinos, especialmente entre os imigrantes. Infelizmente, os figurinos, assim como as personalidades dos imigrantes são um tanto quanto estereotipados.

É possível dizer o mesmo das atuações. Os atores parecem levar seus personagens ao extremo do arquétipo de cada país, como se não tivessem feito nenhuma pesquisa sobre o assunto. Talvez a ideia seja deixar esses personagens caricatos para diminuir o tom dramático do filme e amenizar o tema, mas a impressão que fica é que o longa retrata tudo isso de maneira bem superficial.
Agnès Jaoui, que interpreta Isabelle, até parece focada em seu personagem e apresenta uma boa atuação, o problema é que a protagonista é meio chata e por isso é difícil gostar ou se relacionar com ela.

A produção de Boas Intenções é um reflexo direto do seu título nacional. Certamente existem boas intenções na criação do filme, mas parece que faltou pesquisa e por isso, em alguns momentos o filme soa como um amontoado de cenas de mau gosto tão perdido quanto a sua protagonista.
O filme entra em cartaz no dia 4 de julho.