Coisa Mais Linda – Segunda temporada
Série mantém a sua qualidade e discute temas importantes
Depois da morte de Ligia (Fernanda Vasconcellos), Malu (Maria Casadevall) precisa enfrentar seu luto, enquanto tenta manter seu negócio de pé.
Enquanto isso, Adélia (Pathy Dejesus) se vê frente a frente a uma ameaça séria à sua vida, e mesmo depois de se casar com Capitão (Ícaro Silva), continua pensando em Nelson (Alexandre Cioletti), marido de Thereza (Mel Lisboa).
Thereza, por outro lado, vê seu casamento entrar em uma crise, ao mesmo tempo em que ela tenta uma nova profissão como radialista.
Coisa Mais Linda – 2ª temporada – O que mudou?
No último episódio da primeira temporada, Augusto (Gustavo Vaz) atirou em Ligia, sua esposa. A segunda temporada começa um pouco depois desse acontecimento, quando Malu acorda no hospital e descobre que Ligia está morta. É a partir daí que Malu precisa seguir com sua vida, cuidando do seu bar e buscando sua independência. Ela se aproxima ainda mais de Adélia e Thereza e as três mulheres se consolam.
Mas claro que outros desafios surgem no caminho delas. Adélia, que acabou de se casar com Capitão, descobre que tem uma doença terrível e possivelmente mortal, que ela resolve esconder da família e dos amigos. A única pessoa que fica sabendo disso é Nelson, pai de sua filha.
Nelson, por sua vez, é casado com Thereza, mas desde que ele reencontrou Adélia e sua filha, o casamento vem enfrentando uma crise, e ele vem se questionando se quer ficar com Thereza ou Adélia. A segunda temporada de Coisa Mais Linda traz então, outros problemas e outras questões para suas protagonistas.
Protagonismo feminino
Uma das coisas que chama atenção na série, inclusive na primeira temporada, é o protagonismo feminino. A produção dá bastante destaque a essas mulheres que são fortes, trabalhadoras e inteligentes. No entanto, na segunda temporada, a série já começa com uma baixa, afinal, Ligia foi assassinada. É uma perda, já que a personagem não só era interessante, como também representava uma mulher que vivia um relacionamento abusivo e que precisava aguentar violência doméstica, e a discussão que vinha à tona com as tramas de sua vida eram, sem dúvida, importantes.
Por outro lado, essa temporada dá mais importância para Ivone (Larissa Nunes), a irmã de Adélia, que quer ser cantora. Como Malu é dona de um bar, o local parece a oportunidade perfeita para Ivone começar a sua carreira. O que é interessante aqui é que não só a série mantém o mesmo número de personagens femininas, como também dá o protagonismo a mais uma personagem negra.
Violência contra a mulher
Coisa Mais Linda se passa no final dos anos 1950 e começo dos 1960, e retrata uma sociedade ainda mais machista do que a dos dias de hoje. Na primeira temporada já acompanhamos as dificuldades que Malu enfrentou para conseguir abrir seu bar e para se tornar uma mulher de negócios e a violência e o abuso que Ligia sofria nas mãos do marido.
Na segunda temporada, esse assunto volta. Seja em questões mais leves quando, por exemplo, Thereza diz a um homem que não é porque ela é feminista e uma mulher livre – e muito à frente de seu tempo – que ela é obrigada a fazer sexo com qualquer pessoa, seja em questões um pouco mais pesadas.
Quando um político (Ângelo Paes Leme) ameaça fechar o bar de Malu a não ser que ela mantenha relações sexuais com ele, a série fala sobre o assédio e mais especificamente, sobre o assédio dentro do ambiente do trabalho. E claro, a questão da violência contra a mulher também volta e, dessa vez, Coisa Mais Linda fala sobre o feminicídio.
Feminicídio
Sabemos desde o primeiro episódio que Ligia foi assassinada por Augusto e, nessa temporada, ele vai a julgamento e a plateia acompanha isso. Enquanto Augusto e seus advogados se preocupam em difamar Ligia, como se isso pudesse justificar seu assassinato, Malu, Thereza e Adélia dão seus depoimentos deixando claro quem a amiga era e ressaltando que, independentemente disso, Ligia não poderia jamais ser morta. A ideia pode soar um pouco moderna para o começo dos anos 1960, época onde a violência contra a mulher ainda era justificada, mas como a série é de 2020, ela tem obrigação de abordar essas questões com os olhos de hoje.
O assassinato de Ligia é uma referência a um feminicídio real: o assassinato de Ângela Diniz. Ângela foi assassinada, como Ligia, pelo companheiro Doca Street, no dia 31 de dezembro de 1976. Nos tribunais, a defesa também atribuiu a culpa do crime à vítima. Ela foi pintada como sedutora e promíscua, o que teria ferido a honra de Street. Mesmo que toda essa trama soe absurda e antiga, o feminicídio e a culpabilização da vítima prosseguem nos dias de hoje e é importantíssimo que a série se disponha a falar sobre isso.
Aspectos técnicos de Coisa Mais Linda – 2ª temporada
Como a primeira temporada, a segunda também tem uma produção bem-feita e cuidadosa. O figurino coloca o telespectador naquela época. É interessante notar que as roupas das personagens não são aquelas que nos remetem diretamente a década de 1960, o que faz muito sentido, já que a segunda temporada se passa exatamente em 1960 e faria sentido pensar que a moda ainda não tinha mudado totalmente.
Se na primeira temporada Malu começava usando roupas mais refinadas e com o tempo ia mudando seu figurino para roupas mais simples, que combinavam mais com a sua nova vida, na segunda temporada, Malu já é uma empresária que se sustenta sozinha, então, suas roupas, embora lindas, mantém o estilo mais simples. Também existe uma diferença bem clara entre as roupas das quatro protagonistas. Adélia e Ivone são mulheres mais pobres e, por isso, usam roupas bem mais simples. Enquanto isso, Thereza é uma mulher rica que usa roupas mais provocantes e justas, já que ela faz um estilo mais femme fatale.
A série mantém as boas atuações, como as de Maria Casadevall, que parece feita para o papel de Malu, Pathy Dejesus e Ícaro Silva. Também é muito fácil se relacionar e se afeiçoar com os personagens, por isso a série é fácil de acompanhar e quase impossível de largar.
Mais algumas considerações
Coisa Mais Linda – 2ª temporada tem um roteiro interessante que coloca seus personagens a frente de outros desafios. Ela aborda temas importantes e que devem ser discutidos. No entanto, é menos cuidadoso que o da primeira. Algumas questões parecem um pouco jogadas e não são muito bem desenvolvidas, como a doença de Adélia, que surge do nada e que não tem uma conclusão muito realista.
Essas não são questões que atrapalham o produto final. Pode-se passar por cima desses detalhes, porque Coisa Mais Linda tem uma boa produção e uma trama interessante, com personagens cativantes. De uma forma geral, a segunda temporada mantém a qualidade da primeira, mesmo que dê pequenas escorregadas.
Aqui temos um ótimo exemplo de como o audiovisual brasileiro tem extrema qualidade e, para além disso, a série tem uma boa trama, personagens bem escritos de quem o telespectador gosta e quer acompanhar e discute temas importantes como machismo, feminicídio, racismo, preconceito e violência contra a mulher.
A segunda temporada de Coisa Mais Linda está disponível na Netflix.