Espíritos da Vingança: Guerra nos Portões do Inferno
Você já viu ou leu sobre essa história antes, mas não com os personagens da Marvel
O misterioso assassinato de um anjo com uma bala de prata dá início a uma investigação encabeçada por ninguém menos que Daimon Hellstrom, o filho de Satã! Procurado por Johnny Blaze a fim de solucionar o crime, uma aliança como nunca se viu é formada por alguns dos principais personagens do Universo Marvel que têm ligação com o mundo sobrenatural. Assim, além de Hellstorm e sua irmã Satana, se juntam a eles o caçador de vampiros Blade e Motoqueiro Fantasma. Juntos, eles se tornam os Espíritos da Vingança! Precisam então impedir a derradeira e mais mortal luta entre o Céu e o Inferno!
Neste novo encadernado da Panini, a Marvel tenta fazer sua própria versão da Liga da Justiça Sombria. Esta que rendeu ótimas histórias na era pré-Renascimento, vale lembrar. Mas, ainda que não atinja o mesmo resultado (afinal, a concorrência detém muito mais ícones pelo lado sobrenatural), consegue fornecer um entretenimento bastante divertido e dinâmico.
A trama de Espíritos da Vingança: Guerra nos Portões do Inferno
Gischler não é nenhum roteirista inovador, mas sabe escrever diálogos sem ser piegas ou exagerado. Ele parece conhecer o quarteto o suficiente para gerar boas interações. Um bom fruto disso é que nenhum dos personagens precisa se desentender para depois se unir contra um mal em comum, uma fórmula há muito batida.
Por outro lado, ele segue o enredo por uma via segura, executando um thriller de investigação. Cada novo informante é responsável por fornecer uma cena que agrega ao background ou gera sequências de lutas e mortes. A medida que evidencia o outro lado da moeda, revela os verdadeiros responsáveis pelo plano maligno nos bastidores, que pode culminar em uma tragédia maior. E mesmo assim, o roteirista consegue guardar uma pequena surpresinha antes do fim, por mais óbvia que ela seja.
Toda a construção da história renderia um bom filme do gênero. A relação faz sentido porque funciona justamente consciente dessa estrutura narrativa. Nenhum dos quatro brilha mais do que o outro. Todos parecem meio auto-contidos, sem explicar demais quem são ou de onde vieram. Eu poderia dizer que o autor contava com a memória ou a nerdice de seu público… mas a verdade é que a edição já traz uma ficha de cada anti-herói antes, para resolver a questão.
Os personagens
No saldo final, Johnny Blaze, o Motoqueiro Fantasma, é o que parece mais interessante, com um gesto mais grandioso no clímax. Porém, é graças a Daimon Hellstorm que a trama anda, pois o figurão tira contatos da manga e sustenta os diálogos com uma sensatez interessante. Satana e Blade servem somente para a ação e mesmo assim não impressionam tanto. Outros personagens, como Necrodamus, Razan, a Chacal Noturna e Beleth, guardam suas surpresas e motivações mais bem esclarecidas.
A narrativa visual de Baldeón é uma delícia de acompanhar. O desenhista explora enquadramentos ousados e dinâmicos. Entrega energia a cada página e jamais cansa a leitura das 116 páginas (mesmo que vez ou outra, seus rostos sejam todos iguais). O artista parece empolgado justamente nas espetaculares sequências de ação. Ali ele extrapola nos desenhos. E quando faz seus demônios, nos remete imediatamente a Greg Capullo na sua famosa passagem por Spawn.
Embalado pelas vibrantes e saturadas cores de Andres Mossa, o desenhista tem um dos estilos mais bonitos dos comics atuais. Mas se perde quando precisa executar cenas com o Motoqueiro, gerando uma verdadeira confusão visual, onde nada faz sentido (mas precisa?).
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A primeira parte de Guerra nos Portões do Inferno serve tanto para dar um propósito da criação do grupo Espíritos da Vingança, quanto para valorizar personagens tão relegados pela Marvel em segundo plano. Mas principalmente para evidenciar um outro lado da Casa das Ideias, onde anjos e demônios existem. Leitores de primeira viagem podem investir sem medo no encadernado, que ainda traz todas as capas originais ao final da edição (e se forem espectadores de Supernatural, Lúcifer e American Gods, terão percepção de certa familiaridade temática e textual por aqui). A história, mesmo sendo parte de algo maior, é redonda, com começo, meio e fim, desse pequeno arco enervante e super divertido.