Jurassic World: Reino Ameaçado, problema no “mundo dos dinos”

Jurassic Park é uma obra-prima mesmo até os dias de hoje e entre os vários motivos que eu poderia listar, além do maravilhamento que os dinossauros causavam em 1993, está o arco de personagens humanos, principalmente da figura do homem que rejeitava a paternalidade, para justamente se provar um paizão quando crianças necessitam de sua ajuda e de sua compaixão.

Nunca esperei por um filme que superasse o primeiro e nenhuma continuação jamais chegou aos pés do longa de origem. E tudo bem. Todos os demais cumpriram suas promessas, dentro do que se propuseram a fazer. Enquanto que em Mundo Perdido tínhamos uma revisitação a premissa de King Kong (mas com um T-Rex); no terceiro, a adição de pterodátilos e do espinossauro não foram suficientes para o crescente, de uma trama que se sustenta apenas episodicamente. Jurassic World de 2015 serve tanto como sequência como prequência do primeiro filme, obtendo bons resultados justamente por isso, incluindo aí um clímax inesquecível e impactante.

Em Reino Ameaçado, um inspirado J.A. Bayona é convidado a assumir a direção, dessa vez para trazer outros tons para a franquia: o do terror e o de fábula, visto que tais gêneros já foram bem explorados pelo diretor antes, nos excelentes O Orfanato e Sete Munitos Depois da Meia-Noite, que justificam sua escolha aqui.

Mas há muito mais elementos que enfraquecem essa continuação, do que pontos positivos. A começar pelo vulcão conveniente, que sempre esteve inativo na Ilha Nublar, mas 3 anos após os eventos do outro longa, se reativa e ameaça toda uma nova espécie de dinos, o que divide a humanidade em discursos e escolhas (colocando o personagem icônico de Jeff Goldblum com uma participação especial, um argumento sensato e uma decisão inesperada a frente de tal questão), fazendo com que a pequena equipe de Claire (personagem da sempre linda e funcional Bryce Dallas Howard) mova esforços para salvar os jurássicos antes da perdição. E realmente, o que move boa parte do enredo, é justamente a salvação da espécie do “reino ameaçado” (que ganha outro sentido ao final do filme, sendo este “reino” o nosso).

Se relevarmos a forçação de barra com o uso do vulcão como recurso desesperado (e que gera uma das melhores sequências do filme, com o extermínio da ilha e momentos absurdos, que todo filme pipoca necessita), ainda sobram outros probleminhas. Enquanto que no primeiro, ao replicar a obra de origem, também fornecia desenvolvimento de personagens, aqui não sobra personagem para ser desenvolvido. Todo o arco do casal principal já aconteceu antes e o fato deles não estarem juntos novamente, além de soar como um eco penoso, não mostra qualquer evolução. Por isso, Claire e Owen (Chris Pratt, carismático como sempre, mas em piloto automático de atuação de gênero) apenas servem à trama como ferramentas de colaboração para situações de risco, assim como os demais personagens (por isso, a gracinha da Daniella Pineda como Zia Rodriguez é uma convincente veterinária apaixonada pela vida animal; e Justice Smith como Frank Webb, apesar dos gritinhos irritantes, é humanamente divertido em suas desventuras).

James Cromwell faz uma participação especial, gerando um link com John Hammond e abrindo um inesperado novo cenário para comportar os gigantes, a medida que apresenta a personagem mirim de Isabella Sermon, que além de servir como a criança em apuros no melhor horror juvenil que Bayona consegue atingir aqui com a casa medieval, o uso de parapeitos e as garras malignas sobre a coberta, com uma fotografia favorável ao tom, não há nada mais que ela ou qualquer outro possam fazer pelo longa. Depois que a última reviravolta – uma subtrama que o filme supervalorizava desde o começo com o mistério da fotografia – é entregue pelo vilão sem qualquer consequência para a trama, definitivamente fica claro que este Jurassic World 2 não é um filme de personagens (humanos). O que resta a Maisie Lockwood é apenas a escolha de apertar ou não o botão vermelho da libertação ou da condenação, único elemento que justifica a existência da personagem, mas é pouco, bem pouco.

Blue, a raptor de estimação do protagonista, fornece momentos mais emocionais, tanto pelos vídeos de sua versão filhote, o que ajuda a criar carisma (Como Treinar o Seu Dragão fez escola) e a torcer por ela, tanto para sobreviver a um tiro, quanto pela sua batalha final. A T-Rex tem cenas reduzidas a fim de evitar muitos ecos, mas veja só, temos novamente mais um dino-mutante criado por humanos (se antes era um T-Rex do mal, agora é um Raptor overpower) e novamente humanos ambiciosos que se provam malignos com suas perversas intenções de uso dos jurássicos. Já vimos isso antes, por isso essa história fica com gosto de repetição. Cada cena é meio óbvia e não apresenta nenhuma surpresa de verdade.

É claro que assistirmos aos humanos fugindo da ilha sendo atingida por lava, ou do protagonista quase sendo abocanhado dentro de uma jaula, ou do monstro escondido nas sombras de um museu, e daquele ataque surpresa no momento certo, geram ótimas situações em tela, com um dos melhores CG da franquia (mais uma vez beneficiado pelo uso em conjunto com animatrônicos), sem contar a única cena realmente emocionante, daquela de colocar ciscos em nossos olhos, com o brontossauro (sempre a figura pacata e da bondade ingênua) sendo engolido pelo caos da natureza. Mas nada disso sustenta uma trama sem figuras humanas para sustentar as ligações.

É sim um grandioso e divertido filme de monstros (pela primeira vez a franquia Jurassic se aproxima mais desse termo, do que antes), com um terror bem executado, mas não sei se faz juz exatamente ao todo. Talvez não precise. Afinal, Jurassic Park é singular e tudo o que veio depois é apenas diversão escapista para não deixarmos de acompanhar os herdeiros de Spielberg fazendo o que podem, com o que tem em mãos.

Mas existe uma promessa, desde o primeiro Jurassic World, de colocar raptores com tiros lasers usados em exércitos, que precisa ser cumprida em algum momento. E com o fecho da segunda trilogia se aproximando, teremos de fato um “mundo dos dinossauros” para acompanhar, e ver como a convivência entre dinos e humanos se desenvolverá, se cairá pro terror ou pro piegas. E essa premissa ficará para o próximo diretor que assumir a franquia.

Jurassic World: Reino Ameaçado

Pelo menos você poderá dizer que pela primeira vez viu um dinossauro chorar.

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