Rogéria, Senhor Astolfo Barroso Pinto
Documentário sobre a artista
Rogéria, Senhor Astolfo Barroso Pinto conta a vida de Rogéria explorando a dualidade de sua personalidade dividida entre Rogéria, a transformista, e Astolfo, seu nome de nascença. Com entrevistas de Bibi Ferreira, Betty Faria, Jô Soares e da própria Rogéria, o documentário traça um panorama dessa incrível personalidade.
O filme é um documentário, mas usa de muitos aspectos da ficção. Existem cenas, por exemplo, do passado dela, dramatizadas, mais ou menos como acontece em programas sobre crimes reais. É assim que a acompanhamos ainda criança, e nessa época se apresentando como Astolfo, enfrentando os meninos que mexiam com ela e conversando com a mãe, que a aceitava.
O filme também apresenta outra drag queen que faz performances conceituais que se conectam com a vida de Rogéria. Nesse aspecto, o documentário é um tanto quanto diferente, já que mistura duas linguagens. Essa técnica, claro, aproxima o público que não está tão acostumado com documentários, o que é uma qualidade positiva.
O legado de Rogéria
O filme tem entrevistas com a própria Rogéria, feitas especificamente para o filme, por isso, é possível concluir que o filme foi gravado antes da artista falecer. Como só chega aos cinemas agora, pode ser considerado uma homenagem a Rogéria e um filme que fala sobre o seu legado. Sua importância, em todas as instancias, é inegável, mas para o movimento LGBTQ+ é maior ainda. Ela se chama de travesti e eventualmente de transformista, mas quando escutamos a ideia que ela tem de si (um homem, que tem um personagem que é mulher, mas que nunca desejou ser mulher), podemos enquadrá-la como drag queen.
O documentário mostra como Rogéria já era à frente do seu tempo, e já andava montada em plena ditadura militar. Outras artistas como Nany People também falam da influência que Rogéria exerceu sobre ela, uma vez que Rogéria representava algo que ela queria ser e não tinha coragem ainda para expressar.
Mais do que isso, o filme apresenta mulheres cisgêneras que foram profundamente influenciadas pela artista. Betty Faria, que foi maquiada por Rogéria quando ela ainda trabalhava como maquiadora e que mais tarde atuou com ela em Tieta; e Rita Cadillac, que aprendeu a se maquiar e se arrumar com a artista, dão seus depoimentos.
O longa também mostra uma enorme quantidade de trabalhos que Rogéria fez, como peças de teatro, filmes, humorísticos e programas de TV, isso em um país que é homofóbico e transfóbico, ainda hoje, que dirá naquela época. A própria se definia como “o travesti da família brasileira” e essa parece uma descrição acertada de um fenômeno como ela.
Aspectos técnicos
A produção é relativamente simples, em aspectos técnicos. As entrevistas parecem ser gravadas, em sua maioria, nas casas dos entrevistados e sem muita variedade de câmera. Isso não é um problema, já que o filme cabe dentro das características clássicas do gênero.
No entanto, a pesquisa por trás do projeto é gigantesca e visível. O doc apresenta imagens e fotos de arquivo, que são raras e extremamente importantes e interessantes. Os espectadores podem ver imagens de shows antigos, que deixam claro todo seu talento.
Além disso, o documentário aborda temas profundos como identidade, preconceito e até vida sexual. No entanto, a obra dá alguns saltos de tempo, que talvez sejam necessários, mas que deixam um pedaço da história faltando. É óbvio que não se pode cobrir a vida inteira de uma pessoa tão extraordinária, mas o documentário parece dar ênfase a alguns pedaços da vida de Rogéria e deixar algumas lacunas.
Rogéria, Senhor Astolfo Barroso Pinto se mantém como um documentário necessário que fala de uma pessoa que talvez nunca tenha ganhado todo o reconhecimento que merecia. O filme mostra Rogéria além da mulher, além do homem, mas como uma artista. O filme entra em cartaz no dia 31 de outubro.