Sniper Americano, um assassino é consagrado herói
Sniper Americano é adaptado do livro “American Sniper: The Autobiography of the Most Lethal Sniper in U.S. Militar History”. O filme conta a história real de Chris Kyle, atirador de elite das forças especiais da marinha americana. O homem deixa 165 mortos confirmados (de um total de 255), tendo recebido diversas condecorações por sua atuação na Guerra do Iraque.
Neste, que é um dos melhores filmes da carreira de Clint Eastwood como diretor, a história é tratada claramente como um “western de guerra”. Há inclusive o encontro de dois atiradores rivais no deserto e os dilemas entre o mocinho e a família. Assim, essa premissa cruel e conservadora funciona sobre um lado da peleja. Celebra então um patriota americano visto como um dos maiores heróis após os eventos do 11 de setembro.
Sniper Americano
Fazendo bom uso do baixo orçamento e da direção crua e direta, Eastwood extrai o melhor do elenco. Executa cenas ultrarrealistas e sem qualquer pudor, em um retrato fiel e honesto daqueles eventos. Ainda que o enredo opte por uma figuração conservadora entre o “bem” e o “mal”.
Bradley Cooper brilha sozinho em cena, atestando novamente ser um dos maiores atores de seu tempo. Ao ganhar peso para o papel, ele assume os trejeitos de Kyle. Incluindo o sotaque texano, e até mesmo a maneira como o sniper segurava um rifle. Realizando assim, tudo isso de maneira natural, onde não transparece qualquer atuação. Sienna Miller ajuda a equilibrar a balança, mostrando como Taya Kyle acompanhou o processo de desumanização do marido. A relação dos dois atores é entrosada e crível em tela afinal.
Jake McDorman e Luke Grimes ainda agregam sentimentos e certo “humor” à trama, carregadíssima, que funciona dentro de um mecanismo preto-no-branco de seu protagonista. Kyle foi criado desde a infância a usar uma arma, em um retrato típico de masculinidade tóxica, pela aberração que era seu pai.
O homem passou ao filho, ainda pequeno, a ideia de que a humanidade era dividida em lobos, cordeiros e cães pastores. Kyle decidiu então ficar com o terceiro papel, compreendendo que qualquer vítima da guerra era um cordeiro e que o inimigo iraquiano assumia a forma de lobos. Mesmo em momentos de descontração, é difícil simpatizar com Kyle, ainda que torçamos por ele cena aqui e ali, dado o contexto em que são apresentadas.
O que a guerra faz com um homem
Entretanto, o desfecho trágico e com intuito de ser emocionante (para quem, senão somente para patriotas?), é vago, sem qualquer explicação para quem não conhecia a história do atirador (como a maioria do público não norte americano). Se a parte biográfica é conservadora e auto-indulgente demais, pelo menos a direção de Clint compensa a narrativa com um espetáculo visual realista, jogando o espectador no meio do caos, fazendo-nos engolir sangue e poeira durante esse estudo psicológico do protagonista.
Dono de uma mira precisa, o atirador de elite era o pastor que protegia seus colegas de ameaças aparentemente invisíveis, os fazendo acreditar que alguém olhava por eles nos momentos de perigo. E no código que regeu sua vida do começo ao fim, “Deus. Nação. Família.”, Chris Kyle finalmente voltou para casa, mas na verdade jamais saiu do Iraque.