Veneza – um filme de sonho de Miguel Falabella

Veneza é um filme poético que, em tempos difíceis, fala sobre a construção de sonhos misturados à realidade dura de um prostíbulo. Filmado parte no Uruguai e parte na Itália, este é o longa metragem que Miguel Falabella idealizou há uns 20 anos ao ter seu primeiro contato com a peça de teatro que ele diz ter “guardado em papel de seda” até poder realizá-lo nas telonas, pois nesse meio tempo ele chegou a também produzir a peça teatral que tem texto original de Jorge Accane.

A produção se iniciou em 2018, antecedendo a pandemia, mas parece ter sido construída para quem está passando por tempos difíceis. É quase como se antevisse a situação em que o país estaria após o caos que a Covid-19 instaurou.

Como um antídoto para estes dias mais difíceis, Veneza é agradável de assistir e serve perfeitamente àqueles que tem um olhar poético sobre a vida. Através do uso de metáforas e realismo fantástico, o filme passeia sobre a trajetória de Gringa, uma senhora que foi prostituta e que, quando jovem, sonhava em ter seu próprio bordel. Esta senhora é interpretada por Carmen Maura, a grande “musa” dos filmes de Almodóvar. Ela aprendeu algumas palavras em português e se dedicou estudando para compor a personagem que falaria portunhol.

Veneza
Carmem Maura é Gringa

Veneza

Ao conhecer um jovem rapaz que a pede em casamento, a moça espanhola hesita em aceitar a proposta de viver casada em Veneza, para ir atrás de seus objetivos. Com isso, ao envelhecer e se encontrar com crises de abstinência da realidade, por ter sua memória prejudicada, ela sempre menciona para suas funcionárias do prostíbulo que gostaria de ir à Veneza para reviver aquele grande amor.

O casarão antigo onde vivem, abriga hoje uma “família” formada pelas prostitutas e por um empregado, Tonho, que é o “faz tudo” e trabalha em troca de favores sexuais. Dentro dessa comunidade, que recebe todas as noites seus clientes, temos Madalena, uma prostituta sonhadora que está apaixonada por seu cliente fiel, Júlio, aquele que tem seus gostos escondidos de seu pai pois teme não poder mais realizar suas fantasias e desejos ao lado da amada.

Carol Castro e Caio Manhente formam esse casal. Ele é um homem que sente prazer em se vestir de mulher e ao mesmo tempo é apaixonado por uma prostituta. Ela tem sonhos de se casar, viver com ele em algum lugar longe dali, onde possam juntos dar continuidade a esses sonhos. Ele sendo quem ele é e ela correspondendo a esse amor, que não é aceito pela família do rapaz.

Veneza
Caio Manhente e Roney Villela

Várias tramas

Esta história corre em paralelo e serve pra preencher os apenas 40 minutos de enredo da peça teatral no qual se baseia o longa. Miguel Falabella pediu permissão para adaptar para o cinema e inserir algumas cenas que se tornaram importantes para o tema dos sonhos.

Junto a tudo isso, Dira Paes é Rita, quase que uma mãe para todos eles. Ela dirige o bordel, tem uma relação amorosa com Tonho e quer de todas as formas conseguir realizar o sonho de Gringa ir à Veneza. A senhora está cega e já alcança certa demência, então, como realizar este sonho, senão através do encantamento? Rita consegue, assim como Madalena, realizar fantasias com ajuda de seus colegas do circo.

O circo faz um papel quase como um personagem. Ele traz conceitos que intercalam entre o uso de Preto e Branco e colorido, misturando drama, arte, poesia e riso à história. Além disso, é o estopim do movimento de esperança e concretização de sonhos.

Veneza
Carol Castro, Eduardo Moscovis, Dira Paes, Danielle Winits e Laura Lobo

Alguns aspectos técnicos

Veneza é um filme que carrega certa densidade de discursos. É um drama potente que sai do padrão dos filmes nacionais e encanta e emociona, mas ao mesmo tempo tem algumas coisas que incomodam…

A fotografia e a direção de arte são pesadas, com pouca luz, uso de tons pastéis que pesam o olhar e carregam a produção. E, com a lentidão da história, às vezes tropeçam na linha tênue entre ser melancólico, nostálgico e poético e ser pesado, lento e maçante. Entretanto, estes cenários brutos e a fotografia pesada fazem um contraponto com a leveza dos sonhos e fantasias realizadas, e a poesia da construção com a realidade dura da vida em um prostíbulo.

Por não ter nenhum alívio cômico, não fica tão fácil embarcar quanto poderia, pois não há diluição de textos fluidos, mas sim, um peso dramatúrgico que funciona bastante nos palcos, porém, nem sempre no cinema.

Veneza
Dira Paes e Danielle Winits

E tem mais

Na construção do filme podemos sentir notas de inspiração em obras de Federico Fellini e também Pedro Almodóvar, principalmente quando percebemos personagens complexos e dramáticos dentro de um filme lúdico e poético.

A trilha sonora é um encanto à parte. O espectador poderá ouvir Ludmilla sair de sua zona de conforto e usar seu timbre de voz para cantar um belo bolero onde Dira Paes e Du Moscovis tiveram a possibilidade de dirigir o clipe da música feita para o filme. Miguel Falabella escolheu Ludmilla assim que a ouviu cantar quando jurado de um quadro do programa “Domingão do Faustão”.

Veneza trata de laços de família, aquela que não é construída pela relação consanguínea, mas sim pelo respeito e carinho da convivência de longos anos. Cabe a você, espectador, se deixar levar pela poesia e beleza dessa história e ver a construção de um sonho se tornar realidade, mesmo que de maneira lúdica.

Veneza

Nome Original: Veneza
Direção: Miguel Falabella e Hsu Chien Hsin
Elenco: Carmen Maura, Marie Paquim, André Mattos, Dira Paes, Danielle Winits, Eduardo Moscovis, Carol Castro
Gênero: Drama
Produtora: Ananã Produções, FM Produções, Globo Filmes
Distribuidora: Imagem Filmes
Ano de Lançamento: 2019
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