Os 7 de Chicago – História revoltante baseada em fatos
Um drama de corte poderoso
Aaron Sorkin, premiado roteirista hollywoodiano (especialmente pelo brilhante ”A Rede Social”), já se arriscou no posto de diretor antes (estreando com ”A Grande Jogada”). Novamente ele trabalha dobrado em Os 7 de Chicago, este longa para a Netflix, situado durante os eventos históricos de 1968. Neste ano, diferentes grupos contrários à Guerra do Vietnã se reuniram em um grande protesto em Chicago. Ali era então o local em que acontecia a Convenção Nacional Democrata – evento que anunciou a candidatura de Hubert H. Humphrey à presidência.
As coisas saíram do controle, houve tumulto e alguém tinha que pagar por isso. A decisão do governo foi acusar um seleto grupo de pessoas de conspiração em um julgamento que entrou para a história do país.
Os 7 de Chicago
Fazendo uso eficiente de seu texto sagaz, Sorkin realiza uma introdução dinâmica, que apresenta rapidamente seus principais personagens. Pois mesmo tipificados dentro de estereótipos, o intuito era de criar imediata identificação com o público; à medida que empresta atributos de seu parceiro David Fincher em boas sacadas de direção e edição.
Dessa forma, conduz tudo de maneira enervante do começo ao fim, de modo que as mais de duas horas de rodagem se tornam praticamente imperceptíveis. Nós realmente somos envolvidos por aquelas figuras. Nos revoltamos com o cinismo e a manipulação da lei, e torcemos até o último segundo por uma mera vitória no meio da perdição.
História real
O cineasta, portanto, sabe o que fazer com a matéria prima que tem, mesmo que molde fatos e pessoas em prol de uma narrativa envolvente. Afinal, nenhum recorte histórico, por mais fiel que seja, é imune a mudanças e aqui elas também existem. Assim, estudiosos da história da política norte-americana podem se incomodar mais do que um espectador comum.
Historicamente, foi o prefeito Richard J. Daley quem realmente incitou o ataque da polícia sobre os manifestantes pacíficos, mas neste filme ele é citado vagamente, deixando a responsabilidade pelos atos recaírem diretamente aos policiais – o que gera um eco imediato aos eventos recentes do Black Lives Matter, quando homens da lei mataram mais um homem negro só porque achavam que podiam, desencadeando assim manifestações de nível global, que estão mudando a história do mundo.
No longa, porém, Sorkin opta por vilanizar apenas o juíz Julius Hoffman (que Frank Langella faz de uma maneira adoravelmente insuportável). Ele, de fato, foi inacreditavelmente diabólico e tendencioso durante os longuíssimos dias de julgamento. O diretor também ameniza a figura do advogado de acusação Richard Schultz, que era bem pior do que jamais foi mostrado. Joseph Gordon-Levitt vem se mostrando cada vez melhor nesses papéis variados.
E toma mais elenco
O elenco poderoso ainda conta com os yippies Abbie Hoffman (Sasha Baron Cohen, neste que é o melhor papel de sua carreira) e Jerry Rubin (do cômico e ótimo Jeremy Strong), que enveredam pelo lado mais radical; Tom Hayden (Eddie Redmayne é um dos rostos importantes por aqui, em uma bela atuação) e Rennie Davis (Alex Sharp) preferem uma abordagem mais “limpa”, o que complementa a conduta não-violenta de David Dellinger (John Carroll Lynch, um grande ator desperdiçado com poucas cenas).
Pelo lado dos acusados, o destaque fica por conta de Bobby Seale (Yahya Abdul-Mateen II, que cresce a cada filme), co-fundador do Partido dos Panteras Negras. Sua presença é essencial ainda que de forma menos direta que os demais participantes (senão, seriam os “oito de Chicago”). Coroando as escalações, o filme ainda conta com uma atuação inspirada de Mark Rylance como o advogado de defesa William Kunstler e a rápida participação do sempre querido Michael Keaton como o ex-procurador geral Ramsey Clark. A dinâmica de todas essas figuras se concretiza em tela com diálogos ágeis e afiados, que levam a história para frente a todo momento.
Mesmo recriando certas situações e contextos (como o final poético), retirando uma personagem real aqui, colocando um fictício ali, com Os 7 de Chicago Aaron Sorkin realiza um poderoso filme de tribunal e ainda mais relevante para o nosso cenário atual, que jamais perde a força e serve de manifesto para um futuro melhor.