Um Amor Impossível, as relações entre mães e filhas
Um Amor Impossível é inspirado no livro de Christine Angot. Rachel (Virginie Efira) é uma jovem de 25 anos quando conhece Philippe (Niels Schneider). Os dois começam uma relação que gera a pequena Chantal (interpretada na versão adulta por Jehnny Beth).
Philippe recusa se casar com Rachel e a assumir a menina, mas isso não impede que Rachel faça tudo que é possível para conseguir o que deseja.
Rachel e Philippe
Boa parte de Um Amor Impossível se concentra na relação de Rachel e Philippe, que é muito importante na trama. Rachel é uma moça judia de 25 anos, trabalhadora, de classe media baixa, criada sem a presença do pai. Seu mundo se resume a mulheres e suas relações se dão basicamente entre as amigas do trabalho, sua mãe e sua irmã (Iliana Zabeth).
Já Philippe é de classe alta, não trabalha e nem parece ter nenhuma preocupação com dinheiro. Ele é mais culto que Rachel. Fica claro desde o começo que Rachel se sente inferior, não só a Philippe, mas a pessoas, no geral. Ela se vê fazendo parte de diversas minorias e quando está com Philippe recebe lições sobre livros e coisas que ela não conhece.
Essa diferença de classes e de cultura é extremamente importante para a trama, porque a relação dos dois personagens nunca é mostrada de maneira igual. Rachel sempre aparece como inferior, seja porque ela se coloca nessa posição, seja porque Philippe a coloca nessa posição. Ele, por exemplo, recusa o casamento mesmo sabendo da gravidez, pois não são da mesma classe social. Isso reverbera na relação de Philippe com a filha dos dois, Chantal. O fato dele não querer reconhecer a menina também tem relação com a distância social entre ele e Rachel. Isso não impede, no entanto, que Philippe e a filha mantenham uma relação ao longo dos anos. Assim, Chantal volta para casa jogando na cara da mãe o fato do pai ser mais culto e rico.
A responsabilidade feminina
Um Amor Impossível fala sobre uma situação relativamente comum: mulheres que criam seus filhos sozinhas. Acompanhamos Rachel, que mesmo informando para o pai de sua filha que está grávida, não recebe qualquer apoio. Philippe é, obviamente, tão responsável pela filha quanto Rachel, mas ele só aparece de vez em quando. Mais ou menos como um tio distante que vem em datas especiais.
Rachel, por sua vez, se mantém firme e forte. Ela não pensa em nenhum momento em terminar a gravidez ou em colocar sua filha para adoção. Assim, ela cria Chantal da melhor maneira possível, enfrentando preconceitos e o descaso de Philippe.
Esse não é o ponto mais importante da trama, no entanto. Temos um relance de como toda a responsabilidade pela criança cai nas costas de Rachel, enquanto Philippe segue sua vida como se ele não fosse responsável por Chantal.
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É interessante também notar que o filme se passa no final dos anos 50, e que nesse caso, a situação de Rachel como mãe solteira toma uma dimensão ainda maior, mas mesmo assim, em momento algum ela se mostra envergonhada pela gravidez ou pela filha, de quem ela sente orgulho.
A própria Rachel vem de um lar sem qualquer referência paterna, uma vez que seu pai também foi embora quando ela era pequena, e ela foi criada por sua mãe. Isso faz de Um Amor Impossível um filme basicamente com pontos de vista femininos.
Chantal
O ponto que mais movimenta a trama, na verdade é Chantal. Chantal é o resultado do relacionamento de Rachel e Philippe, assim como também é o que dá forças e movimenta Rachel. Chantal também é a narradora do filme, embora ela o faça do ponto de vista de sua mãe. Chantal narra coisas que ela mesma não presenciou, o que pode soar absurdo, mas funciona muito bem.
O espectador acompanha a garota desde o dia de seu nascimento até a sua vida adulta e com isso, vamos conhecendo a personagem, embora em muitos momentos ela pareça uma completa estranha.
Esse também é um ponto que torna o filme interessante. Chantal narra a história, mas do ponto de vista de Rachel e por isso, não sabemos tudo que se passa, porque Rachel não sabe tudo que acontece. O período da adolescência de Chantel, por exemplo, é um mistério para a sua mãe, assim como o é para nós. Embora Rachel seja um livro aberto, Chantal é um mistério, o que é extremamente importante na trama.
Aspectos técnicos de Um Amor Impossível
Um Amor Impossível é um filme interessante que usa ótimos recursos. A princípio, soa como um filme comum, que quer narrar um romance que não deu certo. No entanto, vamos nos surpreendendo a cada momento. O romance entre Rachel e Philippe, na realidade, só é importante para dar o pontapé inicial da trama, mas fica claro que o filme está mais interessado em falar sobre as relações familiares e mais especificamente, das relações entre mães e filhas.
Este é um filme feminino, baseado em um livro escrito por uma mulher, roteirizado por mulheres, dirigido por uma mulher e protagonizado por mulheres. Embora a relação de Rachel e Philippe seja importante, a relação da protagonista com a sua mãe, sua irmã e mais tarde, sua filha são muito mais.
O filme é narrado em primeira pessoa, por Chantal, mas do ponto de vista de Rachel, o que aproxima o longa de sua obra original, e o que também o torna diferente, afinal, Chantal narra momentos do qual não faz parte e não narra momentos dos quais fez. Esse recurso é extremamente importante para trama, uma vez que assim como Rachel, a audiência não pode ter acesso a tudo, principalmente ao que a protagonista não quer ver de maneira nenhuma.
A passagem do tempo
O filme cobre um período longo de tempo, uma vez que conhecemos Rachel nos seus 25 anos e a acompanhamos até seus 70. A passagem de tempo se dá de maneira rápida, mas não óbvia. O filme não deixa claro em que ano estamos, ou quanto tempo se passou desde a última cena, mas a passagem de tempo é clara pelo crescimento de Chantal, que cada vez aparece de uma maneira diferente. Ela foi interpretada por quatro atrizes diferentes, sem contar os bebês.
A diretora Catherine Corsini também usa da caracterização para deixar isso claro. No começo, por exemplo, Rachel é uma jovem de franja e roupas típicas dos anos 50. Ao longo do tempo, seus cabelos e suas roupas mudam e vamos entendendo que o tempo está passando, não só pelas mudanças de roupas, mas também pela maneira com que a maturidade vai mudando o estilo de Rachel e de como a moda muda com os anos.
Rachel e Philippe são interpretados pelos mesmos atores durante todo o filme, por isso, a caracterização é extremamente importante, especialmente para Virginie Efira, que já tem 42 anos, mas no começo do filme interpreta uma jovem de 25 anos e no final, uma senhora de 70 e faz as duas coisas de maneira convincente.
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Claro que a atuação dos dois também é competente e muito da ideia de maturidade que a plateia percebe vem do trabalho de Efira e Schneider. Ela está presente em mais da metade das cenas e ele está tão bem no papel, que sentimos por ele, o que Rachel sente, uma vez que conhecemos Philippe apenas pelo ponto de vista de Rachel.
Um Amor Impossível é um filme sobre as coisas que não são ditas e que não ficam claras, por isso, os detalhes são muito importantes. Ele soa como um romance, embora tenha intenções muito maiores que essa. É uma mistura de drama sobre as relações familiares, com um suspense que surge durante a trama, repleto de personagens femininas fortes e que tem muito cuidado na sua parte técnica.
O filme entra em cartaz no dia 22 de agosto.